Filme seminal e representativo do fim da década
de 1960, início da de 70, quando o cinema norte-americano realizou obras de
ousadia temática em função de uma recém instaurada independência dos grandes
estúdios, “Perdidos Na Noite” perpetrou sua mais audaciosa ousadia –das muitas
que o filme pratica com coragem e destreza –ganhando o Oscar de Melhor Filme em
1970.
Pela primeira vez um filme de alta censura, tão
dedicado à temática das ruas e à uma abordagem despojada adquiria o
reconhecimento extremo a que uma obra de cinema pode almejar, o quê igualava em
padrões de excelência todo esse novo esforço cinematográfico emergente e
comprometido com o realismo ao classicismo já amplamente consagrado dos
estúdios da Velha Hollywood.
Dramaticamente, “Perdidos Na Noite” faz sua
lição de casa, revelando-se um trabalho primordial e acertado: Joe Buck (Jon
Voight se fazendo perfeito no papel), cowboy fascinado com a cidade grande
chega à Nova York vindo do interior com a clara intenção de ganhar a vida como
gigolô de mulheres, autoconfiante de seu porte físico. Entretanto, na miséria e
na exclusão com que se depara, ele encontra companheirismo em Ratso Rizzo
(Dustin Hoffman empregando um repertório esplêndido de tiques e cacoetes ao
personagem), malandro desleixado cheio de vícios e golpes oriundos de uma
difícil vivência na metrópole.
Buck é para Rizzo uma genuína esperança de
obter dinheiro, e quem sabe, realizar um velho sonho de conhecer a ensolarada
Flórida.
Nessa ciranda de dependências (Buck depende da
experiência de Rizzo para que seus objetivos não tropecem em seu excesso de
ingenuidade; e Rizzo precisa de Buck para fazer o que suas feições repulsivas e
seu físico debilitado são incapazes de fazer), os dois personagens protagonizam
diversas desventuras ao longo de sua tentativa de sobrevivência na cidade à
medida que esses eventos vão progredindo do divertidamente irônico ao
espiritualmente comovente, aspecto que a apurada e habilidosa direção de John
Schlesinger trata de moldar em paralelo com a crescente empatia do expectador
com os personagens. Para tanto, prevalecem neste belo trabalho o roteiro coeso
e firme, e as belas atuações da afiada dupla central.
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