segunda-feira, 2 de julho de 2018

Perdidos Na Noite


Filme seminal e representativo do fim da década de 1960, início da de 70, quando o cinema norte-americano realizou obras de ousadia temática em função de uma recém instaurada independência dos grandes estúdios, “Perdidos Na Noite” perpetrou sua mais audaciosa ousadia –das muitas que o filme pratica com coragem e destreza –ganhando o Oscar de Melhor Filme em 1970.
Pela primeira vez um filme de alta censura, tão dedicado à temática das ruas e à uma abordagem despojada adquiria o reconhecimento extremo a que uma obra de cinema pode almejar, o quê igualava em padrões de excelência todo esse novo esforço cinematográfico emergente e comprometido com o realismo ao classicismo já amplamente consagrado dos estúdios da Velha Hollywood.
Dramaticamente, “Perdidos Na Noite” faz sua lição de casa, revelando-se um trabalho primordial e acertado: Joe Buck (Jon Voight se fazendo perfeito no papel), cowboy fascinado com a cidade grande chega à Nova York vindo do interior com a clara intenção de ganhar a vida como gigolô de mulheres, autoconfiante de seu porte físico. Entretanto, na miséria e na exclusão com que se depara, ele encontra companheirismo em Ratso Rizzo (Dustin Hoffman empregando um repertório esplêndido de tiques e cacoetes ao personagem), malandro desleixado cheio de vícios e golpes oriundos de uma difícil vivência na metrópole.
Buck é para Rizzo uma genuína esperança de obter dinheiro, e quem sabe, realizar um velho sonho de conhecer a ensolarada Flórida.
Nessa ciranda de dependências (Buck depende da experiência de Rizzo para que seus objetivos não tropecem em seu excesso de ingenuidade; e Rizzo precisa de Buck para fazer o que suas feições repulsivas e seu físico debilitado são incapazes de fazer), os dois personagens protagonizam diversas desventuras ao longo de sua tentativa de sobrevivência na cidade à medida que esses eventos vão progredindo do divertidamente irônico ao espiritualmente comovente, aspecto que a apurada e habilidosa direção de John Schlesinger trata de moldar em paralelo com a crescente empatia do expectador com os personagens. Para tanto, prevalecem neste belo trabalho o roteiro coeso e firme, e as belas atuações da afiada dupla central.

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