quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Pequena Grande Vida


Outrora especialista em crônicas da vida real sobre personagens absolutamente comuns, o diretor e roteirista Alexander Payne mergulha aqui na sua primeira premissa dotada de um viés de ficção científica. Aproveitando –como todo bom autor que andou pelo gênero –para fazer sua dissertação particular sobre a periclitante situação do meio ambiente e o imponderável destino da raça humana sob esse prisma, sem nunca abandonar, no entanto, o ponto de vista do homem comum.
Tal homem comum é Matt Damon que interpreta o terapeuta ocupacional Paul Safrânek. Desde sempre com a conta bancária no vermelho, Paul junto da esposa (Kristen Wiig) testemunham, no início como todo o mundo, por noticiários na TV, a criação de um método revolucionário para resolver o problema de superpopulação mundial: A miniaturização.
Pessoas são levadas em centros específicos e, por meio de um processo avançadíssimo (esmiuçado pelo roteiro com raro preciosismo), reduzidos a um tamanho de não mais que doze centímetros.
Essas pessoas passam a viver em comunidades montadas especificamente para sua proporção reduzida. O pulo do gato: Sendo muito menores, eles consomem menos comida, ocupam menos espaço e demandam uma quantidade muito menor de recursos –mesmo aqueles que representam uma vida de regalia –e, por consequência, gastam menos dinheiro.
Para Paul, a renda financeira de que dispõe relega ele e a mulher à uma vida suburbana, mas, uma vez reduzidos, esse valor lhes permite uma vida de luxo –um dado que, somado ao fato de um amigo (vivido por Jason Sudeikis) fazer uma exaltada propaganda positiva da miniaturização, o convence a tentar o procedimento.
Entretanto, como vem a ser tão sintomático quanto notável no cinema de Payne, as certezas só se expressam na teoria –na prática, elas esbarram na volatilidade humana: Quando Paul já passou pelo processo de miniaturização, eis que sua esposa lhe anuncia, num telefonema, ter se arrependido.
Assim, a dita nova vida, que Paul almejava com entusiasmo já começa com dolorosos transtornos imprevistos. Solteiro, ele acaba –num reflexo de crise de meia idade –no meio de uma festa promovida pelo vizinho e novo amigo, Dusan (Christoph Waltz), na qual ele acaba conhecendo a diarista Ngoc Lan (a notável Hong Chau), uma ex-ativista e imigrante vietnamita, outrora famosa por uma situação inusitada: No Vietnam, as autoridades passaram a usar a miniaturização para conter o excesso carcerário, reduzindo os prisioneiros, como Ngoc Lan, sem o seu consentimento.
Por isso, Paul descobre, ela entra num nicho desconhecido, que não estava previsto nas ostensivas propagandas: As pessoas pobres que terminam passando pela miniaturazação por inúmeras razões improváveis, e integram o grupo cada vez maior de pobres de classe baixa que passam a trabalhar para os hedonistas miniaturizados das classes superiores.
Ao conceber essa estranha utopia que logo ganha ares de distopia, Alexander Payne parece incapaz (e indiferente) de conter seu ímpeto natural de falar sobre impressões e sentimentos quase sempre muito íntimos e pouco evidentes –muito mais em foco do que o rumo que essa inusitada sociedade em miniatura toma (embora isso também faça parte dos desdobramentos da premissa) está a curiosa relação que se estabelece entre Paul e Ngoc Lan.

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