sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

Vampyres

O subgênero dos vampiros rendeu infindáveis variações. Apesar de sempre haverem obras de valor discutível, nenhuma dessas variações pareceu mais apropriada ao tema do que o erotismo: A dicotomia sangue/sexo, dependência/êxtase aparenta ter uma relação profunda –a aberta a diversas interpretações –no mito dos vampiros.
Intitulado “As Filhas de Drácula”, aqui no Brasil –título este que, além de picareta, não tem qualquer relação com o tema da premissa –o filme do espanhol José Ramon Larraz, “Vampyres”, é uma bela síntese entre dramaturgia satisfatória, erotismo bem administrado e filme de horror.
A trama beneficia-se da aura de mistério inerente ao gênero para contornar com esperteza as limitações orçamentárias e as indefinições e incertezas de alguns aspectos da história.
Num prólogo que depois soa até redundante –mas, certamente nem um pouco modorrento –vemos já de cara duas lindas mulheres nuas na cama de uma mansão em ardente cena de amor; são elas as belíssimas protagonistas do filme, a morena Fran (Marianne Morris) e a loira Miriam (Anulka Dziubinska). Sem maiores detalhes ou explicações, elas são mortas a tiros ali mesmo.
Salta para o início do filme de fato quando o diretor dispõe seus outros personagens aleatórios no contexto: Ted (Murray Brown), um recém-chegado ao hotel local e o casal John e Harriet (Brian Decon e Sally Faulkner), que chegam num carro com trailer para uma estadia corriqueira por aquela região –Harriet é artista e pintará um quadro da mansão mencionada acima (que também serviu de cenário para o cult “Rocky Horror Picture Show”), e John... ele não faz coisa alguma!
Logo, aparições de Fran e Miriam à beira da estrada despertam os instintos de Harriet que presente ali algo de fantasmagórico –e, uma vez que vimos as duas morrer no começo, sabemos que há algo de sobrenatural ali –já, John reage como todo o incauto coadjuvante de filmes de terror: Duvida de tudo e acha que não tem nada de errado nos indícios que se acumulam cada vez mais, alarmando sua esposa.
Quando Ted dá carona à Fran na estrada, ele se torna uma espécie de vítima cativa dela ao ir para sua mansão e com ela passar uma tórrida noite de amor –na qual, sem perceber, ele passa a prover sangue a ela por meio de um corte no braço que cresce dia a dia. Algo em Ted desperta certa empatia em Fran, pois apesar dos ocasionais apelos de Miriam, ela se recusa a dar cabo em definitivo dele, como fazem com outras vítimas, preferindo preservá-lo, mantendo-o numa certa ignorância acerca do óbvio fato delas serem vampiras (estão disponíveis todas as noites, porém simplesmente somem sem explicação durante o dia), mas sugando o sangue dele sempre que pode.
É muito curioso o fato de que Ted, neste ponto exerce um papel que lembra bastante o Jonathan Hacker, de “Drácula”, sendo que seu ator, Murray Brown, viveu o próprio personagem num filme televisivo de Dan Curtis, lançado em 1973, um ano antes deste aqui.
Segue-se assim a continuidade de um ritual: Fran e Miriam, graças a sua inapelável sensualidade, atraem homens todas as noites para a mansão com pretextos banais, e terminam por mata-los, sugando seu sangue. Cada vez mais combalido e deteriorado pelas vampiras, Ted permanece sempre por ali, sem dar-se muita conta do perigo. Já, Harriet e John lentamente vão reunindo coragem para uma especulação dentro da mansão.
A inteligência na condução de Larraz está no fato dele abordar uma trama já rasteira (sequer a origem das duas como vampiras é esboçada com um mínimo de coerência) usando-a devidamente como gatilho para que o filme tem de mais expressivo, o erotismo, que se manifesta em cenas cuidadosamente elaboradas, seja de sexo ou lesbianismo. Essa execução somada à beleza palpitante de suas atrizes não tardou a arregimentar cultuadores para “Vampyres”.
Ele pode ter todas as características negativas que assolam os exemplares mais medíocres do gênero, mas o acerto nos elementos fundamentais ao seu apelo lhe garante um destaque em meio à outras obras.

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