quinta-feira, 18 de julho de 2019

A Maldição de Sanpaku

As coisas caminhavam de forma irregular para o cinema brasileiro no início da década de 1990. A produção áudio-visual havia sofrido um duro golpe com a extinção da Embrafilme, produtora que viabilizava a totalidade de projetos cinematográficos autorais de então.
Dirigido por José Joffily, “A Maldição de Sanpaku” teve o início de sua pré-produção atrelada à Embrafilme, mas ganhou continuidade e foi concluído (e depois distribuído) pela empresa carioca RioFilmes.
Nos moldes de “A Dama do Cine Shanghai”, este “A Maldição de Sanpaku” combina a ambientação brasileira ao gênero noir e vislumbra a aura de originalidade e possível charme distinto que pode surgir da mescla do cinema mundano e promíscuo feito no Brasil (a pornochanchada ainda era uma lembrança recente) com as narrativas cheias de suspense, intrigas e traições que caracterizavam o sub-gênero.
Tudo começa com Gafanhoto (o ótimo Roberto Bomtempo), contrabandista a serviço do mafioso Velho (Sergio Britto) operando na linha Miami/São Paulo. Gafanhoto conta com frequência com a cumplicidade da sedutora comissária de bordo Cris (Patricia Pillar, vivendo uma femme fatale que espelha a norte-americana Sharon Stone, de “Instinto Selvagem”, lançado naquele mesmo ano). Portanto, Gafanhoto sequer pestaneja em envolve-la quando decide tapear o Velho ao substituir uma pedra preciosa avaliada em 200 mil dólares por outra, falsificada.
O golpe de Gafanhoto e Cris poderia acabar aí, mas, na fuga que se segue, eles encontram Poeta (Felipe Camargo), amigo de infância de Gafanhoto, e refugiam-se na sua casa enquanto esperam a insana procura de Velho por eles esfriar.
Entretanto, tal e qual “O Tesouro de Sierra Madre”, de John Huston (e referências cinematográficas, sobretudo, norte-americanas são contumazes aqui) a ganância e a ambição começam a intoxicar a relação desses três protagonistas convertendo a inicial aliança num triângulo amoroso de imprevisível desequilíbrio.
Pela própria maneira como se originou como projeto e pelas condições de produção –um esforço cooperativista que uniu o diretor, os artistas e os técnicos presentes –“A Maldição de Sanpaku” foi uma das primeiras realizações brasileiras que obedeciam o ‘sistema de guerrilha’ que, ao longo de quase toda a década de 1990 foi a única forma de continuar fazendo cinema no Brasil, esforço que culminou na Retomada.
Exatamente por isso, o trabalho de José Joffily tem passagens quase mambembes e uma problemática incompreensão em sua narrativa sobre como fazer o suspense funcionar na maior parte do tempo.

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