O filme de John Mackenzie começa numa sucessão
intrincada de cenas que, até a resolução final, não terão significado algum.
Personagem proeminente nesse prólogo, o gangster vivido por Paul Freeman (o
Beloq de “Os Caçadores da Arca Perdida”) se envolve numa entrega nebulosa.
Algo dá errado, mas não fica claro porque ou
com quem.
O filme de Mackenzie assim desafia abertamente
o expectador em seus quinze minutos iniciais com um plot cujas pontas soltas
não se juntam e nem irão se juntar até que tudo tenha terminado.
Essa provocação e audácia direta para com o
público parece evocar uma oposição do cinema inglês em relação à atitude do
cinema comercial norte-americano, segundo o qual o filme, em seus minutos
iniciais, tem por obrigação conquistar o expectador.
A oposição entre o inglês e o norte-americano
é, por sinal, o combustível dessa narrativa.
Líder de uma ampla máfia londrina, o truculento
e selvagem Charlie (Bob Hoskins, explosivo) tem delicados negócios a serem
fechados com investidores americanos a fim de legitimar suas operações.
Todavia, para seu tormento, uma convergência de
fatores acarreta uma violência imprevista: Atentados ferozes (inclusive à
bomba) eliminam pessoas próximas à Charlie.
Quem são os responsáveis? E por que?
A primeira pergunta, Charlie tenta em vão
responder mobilizando seus capangas a fazer a única coisa que entende:
Retribuir violência com mais violência; ele procura entre os demais gangsteres
londrinos alguém que possa ser o culpado pela onda crescente de retaliações,
enquanto busca, com a ajuda da esposa Victoria (Helen Mirren, deliciosa) deixar
tais eventos desastrosos passarem despercebidos dos americanos.
É claro que, em algum momento, no fulgor da
narrativa que elabora, “Caçada Na Noite” irá encontrar, na já indistinta
lembrança daquele prólogo enigmático, as suas almejadas respostas. Até lá, no
entanto, é exatamente disso que a urgência da narrativa do diretor Mackenzie se
abastece: A tensão densa e implacável de enfrentar um inimigo invisível,
onipresente e que acompanha todos os seus passos, contra o qual os vastos
recursos nada significam.
É tão instigante quanto eletrizante acompanhar
a magnífica atuação de Bob Hoskins, onde ele dá dimensão a um homem consciente
do poder que tem, vendo esse mesmo poder se esvair (ou mostrar-se irrelevante)
ante desconhecidos antagonistas das sombras cujas ações fragmentam
invariavelmente suas esperanças, seus asseclas e as bases do império que
julgava tão sólido.
O cinema inglês de gangster
não fica melhor que isso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário