sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

O Vingador

Não confundir este filme com a aventura homônima estrelada por Vin Diesel em 2003, ou o filme de mesmo nome estrelado por Steve Austin em 2010, ou diversos outros filmes de ação com este mesmo título genérico –uma das indicações da falta de criatividade das distribuidoras brasileiras.
Realizado nos anos 1980 pela produtora Cannon (de “Desejo de Matar”, “Braddock” e diversos outros exemplares do cinema comercial picareta do período), este “Murphy’s Law” –em referência à Lei de Murphy (cujo sobrenome é o mesmo do protagonista) segundo a qual tudo que pode dar errado haverá realmente de dar errado –é um filme policial estrelado por Charles Bronson (astro usual da Cannon) e dirigido por J. Lee Thompson (realizador de “Os Canhões de Navarone” e posteriormente de uma série de outros filmes com Bronson) que parece valer-se de um certa ironia para tentar compor uma proposta diferenciada; e acaba sendo que poucas coisas distinguem este trabalho de outros trabalhos que Bronson fez para pagar as contas naqueles tempos.
Seu personagem –como o título deixa subentendido –é tremendamente azarado: Embora seja tira, Jack Murphy tem seu carro roubado já na primeira cena (!), pela meliante Arabella McGee (a cantora Kathleen Wilhoite) que, pouco depois de bater o carro dele contra a vidraça de um restaurante, foge dando-lhe um chute nas partes baixas (!!).
A maré de má sorte prossegue ao sabor da imaginação sádica do roteirista: A esposa de Murphy (Angel Tompkins) lhe pede o divórcio para, em seguida, ir trabalhar de stripper (!) na boate Madame Tong’s, onde é vista sem roupas por Murphy e todos os demais policiais de seu distrito (!!). Durante as investigações de um homicídio, Murphy em perseguição à um suspeito o alveja a tiros –o indivíduo, que tomba morto, acaba sendo irmão do gangster Frank Vincenzo (Richard Romanus) que assim coloca Murphy em sua lista negra. É até razoável que, por conta disso, Murphy acabe afundando no alcoolismo –o quê compromete ainda mais sua situação profissional.
Como se tudo não bastasse, surge também uma misteriosa assassina (Carrie Snodgress), espécie de serial-killer vingativa que, com a arma do próprio Murphy mata a tiros a ex-mulher dele e o proprietário do Madame Tong’s, com quem ela saía, incriminando assim o tira azarado.
Capturado (pois seus colegas policiais, nada solícitos, sequer cogitam sua inocência) e prestes a ser enviado para a cadeia (onde um policial em meio aos bandidos tem vida curta), Murphy finalmente dá um basta e resolve fugir para procurar por conta própria o verdadeiro assassino –numa manobra que apesar de estabelecer o conceito de sua premissa básica demora um bocado para acontecer.
Detalhe: Quando foge, Murphy está algemado à mesma Arabella McGee que lhe roubou o carro no início (!), obrigando-se assim a levá-la a tiracolo em sua fuga.
“Murphy’s Law”, portanto, é um daqueles filmes protagonizados por aquelas duplas incompatíveis e implicantes cujos tormentos da própria trajetória os converterão em bons amigos, como “48 Horas” ou “Máquina Mortífera”.
Do primeiro, “Murphy’s Law” extrai o detalhe irônico dos dois parceiros serem oriundos de lados opostos da lei; do segundo (produzido anos depois, à propósito), ele traz todos os arquétipos (involuntários, até) dos filmes policiais dos anos 1980 sem o mesmo brilho, porém.
Pois, aqui, a mistura, ainda que curiosamente heterogênea, nunca orna: A parceria entre o policial desafortunado (ao qual Charles Bronson dá um registro praticamente idêntico à todos os outros justiceiros que interpretou) e a contraventora de bom coração e boca suja (cujos impropérios primam por um non-sense sem muita justificativa) não desperta graça em seus objetivos de humor, nem encontra razões mais concretas na condução de sua trama –tratam-se de dois personagens que se unem apenas porque o roteiro assim determinou.
No desfecho, há um esforço para amarrar as tramas individuais num único desenlace narrativo, reunindo todos os desafetos de Murphy num só local –contudo, o clímax resulta soturno e sem empolgação.
Um veterano que teve a infelicidade de não encontrar o devido reconhecimento profissional, o diretor J. Lee Thompson tornou-se, na década de 1980, um dos muitos operários padrões que engrossaram as fileiras das obras canhestras realizadas na Cannon. Em “Murphy’s Law”, sua direção é impessoal, desanimada e algo combalida, demonstrando fôlego limitado para cenas de ação (poucas e básicas) e uma nítida (e consequentemente prejudicial) indiferença para com o conteúdo –este roteiro, escrito por Gail Morgan Rickman (que também não surge, aqui, em sua versão mais promissora) pedia por um realizador que identificasse os instantes de humor negro e sublinhasse suas facetas mais sarcásticas –do jeito como é conduzido e narrado (como uma obra de ação qualquer feita à toque de caixa), “Murphy’s Law” não tem, a frente ou atrás das câmeras, alguém minimamente interessado em injetar personalidade neste projeto.
Se o resultado final –em parte, graças ao carisma de seu astro –é superior ao filme seguinte de J. Lee Thompson e Charles Bronson, “Kinjite-Desejos Proibidos”, isso é mais um acaso feliz do que propriamente mérito dos envolvidos.

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