Havia uma intenção bastante específica quando
foi tomada a decisão de dividir o último livro da “Saga Harry Potter” em dois
filmes: Traduzir o conteúdo da história, profundamente elucidativa para com
todas as pontas soltas deixadas ao longo dos outros seis livros, da forma mais
completa possível –essa prática chegou até a influenciar outras sagas
adolescentes posteriores oriundas da literatura como “Crepúsculo” e "Jogos Vorazes”, cujo livro final também foi dividido em filmes Parte 1 e Parte 2.
Ironicamente, é nesse aspecto que o último
filme dirigido por David Yates deixa a desejar –como veremos mais a frente.
“As Relíquias da Morte-Parte 2” retoma
exatamente o ponto em que a “Parte 1” abandonou o público, quando Voldemort
enfim pôs as mãos na poderosa ‘varinha das varinhas’ e Harry Potter, ainda
perplexo, testemunhou o nobre sacrifício do elfo Dobby.
O filme prossegue daí quando Harry, Hermione e
Rony almejam agora encontrar as outras horcruxes –os artefatos de magia negra
imbuídos de fragmentos da alma de Voldemort: E só para constar, até este ponto
da trama, dentre todas as sete horcruxes já foram mostradas três (o diário de
Tom Riddle, destruído em “A Câmara Secreta”; um anel, destruído por Dumblodore
à duras penas; e o medalhão do qual Harry e Rony deram cabo no filme anterior).
As quatro que ainda faltam, de certa maneira,
determinam a narrativa do filme: A quarta, uma taça enfeitiçada, guardada no
Banco Gringotes, regido por desconfiados duendes –e dentro do qual os três
jovens vão audaciosamente tentar entrar com o pouco confiável auxílio do duende
Grampo (o sensacional Warwick Davis, de “Willow-Na Terra da Magia”). E tome
mais uma cena espetacular quando os três fogem do banco sobre as costas de um
dragão!
A quinta, um lendário diadema roubado da Casa
de Corvinal, obriga Harry e seus amigos a voltarem para Hogwarts, onde Severo
Snape prevalece como diretor impondo os desmandos do Lorde das Trevas e
submetendo os alunos a um regime ditatorial –é na busca por essa horcrux que
Harry se depara com o fantasma de Helena Ravenclaw, vivido por Kelly MacDonald,
a estrela de “The Girl In The Café”, também dirigido por Yates.
A sexta horcrux, numa manobra até bem óbvia vem
a ser a fiel e mortífera cobra Nagini, sempre próxima de Voldemort, enquanto
que a sétima e última, revelada no clímax, vem a ser o próprio Harry Potter
(!), que deve ser sacrificado para que o Lorde das Trevas pereça.
Na esteira dessas revelações e acontecimentos
–que, por sua proximidade fidedigna ao material literário, agrega um excesso de
informações que pode confundir muitos expectadores –o diretor Yates escancara
suas predisposições épicas, já perceptíveis na gradual elevação de escopo em
seus filmes anteriores (especificamente iniciada em “O Enigma do Príncipe”),
mas abraçadas por inteiro aqui na grandiloquente batalha do bem contra o mal
que toma Hogwarts como cenário na última hora de filme, quando praticamente
todos os personagens (alguns interpretados por atores famosos que surgem como
pontas) comparecem deste ou daquele lado.
Não há dúvida de que a possibilidade de
abreviar o mínimo possível os acontecimentos do livro beneficiou o filme.
Contudo, se a “Parte 1” resulta primordial e empolgante por conta disso, a
“Parte 2” sofre pequenas complicações: É maravilhoso poder ver muitos trechos
do livro preservados na íntegra (e uma pena constatar que isso infelizmente não
ocorre com tanta frequência em adaptações cinematográficas em geral), no
entanto, é estranho que justamente a sequência do livro que melhor justifica a
divisão em duas partes seja exatamente a que acaba negligenciada pela narrativa
–trata-se do momento em que Harry Potter contempla as memórias de Severo Snape
(Alan Rickman, certamente o grande ator de toda saga), até então tratado como
um dos grandes vilões da história. Por meio desse momento brilhante, Harry (e o
público junto com ele) descobre as reais motivações de Snape e o porque dele
ser, sem que soubéssemos, um dos grandes heróis da saga!
Um momento revelador, emocional e surpreendente
que merecia no filme o mesmo zelo e cuidado demandado no livro; do jeito como
ficou –numa montagem de cenas simultâneas, quase a lembrar um videoclipe –pode
até suscitar algumas emoções, mas está longe do impacto que poderia ter se
ganhasse a mesma atenção de algumas cenas de ação.
Claro que essas são
impressões menores: Do jeito como está, “As Relíquias da Morte-Parte 2” se
mantêm como um final apoteótico, arrebatador e digno para uma das sagas
cinematográficas mais marcantes dos últimos tempos.
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