quinta-feira, 30 de abril de 2020

Adorável Sedutora

Mais uma brincadeira cinematográfica em torno do rocambolesco e misterioso estilo criado pela escritora Aghata Christie –tal e qual “Os 7 Suspeitos” ou o mais recente “Entre Facas e Segredos” –“Adorável Sedutora” se beneficia da boa condução do australiano Bruce Beresford (que já demonstrou versatilidade e competência em gêneros completamente distintos), do carisma de Tom Selleck (então indissociável de sua série de TV, “Magnum”) e da presena fascinante (e verdadeiramente adorável) da belíssima Paulina Porizkova, top model tcheca que havia estreado com imensa propriedade e vigor em “Anna”.
Tom Selleck interpreta Phil Blackwood, um escritor de romances policiais e detetivescos acometido de um ligeiro bloqueio criativo para com seu próximo trabalho.
A inspiração simplesmente não lhe vem.
Decide, portanto, adotar uma tática inusitada: Ao frequentar audiências de tribunal em busca de ideias, ele descobre a história de Nina Ionescu, a personagem de Paulina Porizkova, uma garota romena acusada de assassinato.
A fim de convertê-la em sua musa –e um tanto quanto afetado pela beleza da moça –ele resolve hospedá-la em sua casa de campo em Connecticut, depois que ela é inocentada em circunstâncias consideravelmente frágeis; afinal, foi o próprio Phil quem se dispôs a servir da álibi para ela! A ideia é tê-la por perto para que sua presença inspira sistematicamente os novos avanços de sua história.
Na trama que Blackwood escreve –e que surge na narrativa em off divertidíssima de Selleck –seu personagem, o destemido detetive Peter Swift, passa a conviver com a ‘femme fatale’, tal e qual o atrapalhado escritor. O problema é que Blackwood não tem qualquer certeza sobre a inocência de Nina; apenas que está inapelavelmente atraído por ela.
E embora a beleza de Nina dificulte vê-la como criminosa, existem, sim, indícios de algo suspeito ocorrendo em torno dela, sobretudo, os homens misteriosos que Phil percebe rondando as imediações desde que lá ela passou a se hospedar (entre os quais, Victor Argo, de “O Rei de Nova York”).
Dessa indefinição constante –mantida pelo roteiro à custo dos mais hábeis subterfúgios –o filme de Beresford tira todo o seu humor: Tom Selleck, com seu bigodão indefectível e sua expressão sempre séria, tem uma cara de marrento com a qual é hilário vê-lo meter-se em enrascadas onde borra-se de medo.
E a Nina de Paulina Porizkova lhe inspira amor, mas lhe inspira muito medo também!
Esses detalhes vergonhosos são todos os que ele lima do livro –afinal, seu personagem precisa ser inabalável, convicto, altivo e machão –mas, que no filme, o diretor faz a maior questão de ressaltar, como a flechada que sem querer (ela diz...) Nina lhe acerta no braço (livro) que na realidade Phil recebe no traseiro (!), ou um gole de uísque num momento em que vai espioná-la, que na verdade é de achocolatado, e várias outras situações onde são exploradas, com resultados hilários, as divergências abissais entre a desengonçada realidade e a idealizada ficção.
Engraçadíssimos são também os diálogos que Phil troca com seu perplexo editor Sam (William Daniels) e, em especial, a sequência, já próxima do desfecho, em que Nina serve a ele e a seus convidados um prato especial segundo uma tradição romena, e o clímax, onde Phil, Nina e Sam se disfarçam de palhaços infiltrados em um circo –quando em seu livro, estão vistosos e nada ridículos em um baile de gala.
Repleto dos lances envolventes e enigmáticos de um bom suspense e dos desdobramentos divertidos e conflituosos de uma comédia romântica, “Adorável Sedutora” é um filme pouco conhecido do público de hoje. Tremenda injustiça para uma obra que agrada com tanta facilidade.

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