Em 1970, Damiano Damiani inspirou-se na
história real de Franca Villa para fazer um filme sobre uma jovem estuprada que
viesse a fornecer uma ideia ao expectador das circunstâncias atrozes, injustas
e desiguais na Sicília de então, dominada por uma cultura na qual os mafiosos
se colocaram no topo de uma pirâmide em todos os âmbitos possíveis.
“Por Amor Ou Vingança” possui um tom muito
similar ao sub-gênero ‘poliziotteschi’ –o filme policial italiano –no qual os
meandros dos delitos e da criminalidade entram inusitadamente em foco. Para
tanto, demora um pouco até Damiani apresentar sua maravilhosa protagonista:
Antes disso, ele define muito bem seu antagonista.
Interpretado com empáfia e arrogância
apropriadas por Alessio Orano, o jovem Vito é apadrinhado pelo mafioso
siciliano Don Antonino. No início do filme, o chefão passa por uma usual ida
para a cadeia e deixa o jovem a frente dos negócios com uma incumbência; de que
logo arrume uma moça para se casar.
Vito não tarda a encontrar aquela que parece
ser sua escolhida: A belíssima Francesca (interpretada por uma estreante e
assombrosamente linda Ornella Muti), filha de família extremamente pobre.
Durante a fase inicial do cortejo, Francesca
–que não é do tipo que leva desaforo para casa –já identifica a personalidade
cruel e pouco razoável de Vito. Assim, seu relacionamento inicia uma série de
idas e vindas que exasperam a personalidade truculenta dele.
Quando os comentários acerca de sua indomável
companheira ferem o orgulho irredutível dele, Vito toma uma decisão radical:
Manda que seus capangas sequestrem Francesca da casa de seus pais e passa a
noite com ela numa casa de campo.
Ele a estupra.
E embora o filme basicamente gire em torno
disso, o diretor Damiani é sucinto e elegante em manter implícito o máximo
possível o ato detestável.
Vito, na verdade, segue a lógica da mentalidade
terrivelmente provinciana e machista da Sicília: Se corre na boca do povo a
estória de que ele e Francesca se deitaram (consensual ou não, isso não
importa) então ela é obrigada a casar-se com ele, do contrário terá sua honra
comprometida na comunidade.
Mas, para espanto dele, Francesca se recusa a
aceitar o desfavor: Ela o denuncia por abuso na polícia local –que já procurava
uma boa razão para enquadrar Vito.
Contudo, a garota se descobre um verdadeiro
Davi contra Golias: Amedrontados pelos mafiosos, nem mesmo os membros da
família dela a apoiam: seu irmão mais novo (testemunha de quando ela foi
raptada) volta atrás em seu depoimento; seus pais, com medo das represálias, se
voltam contra Francesca, ameaçando expulsá-la de casa; e a população local a
discrimina considerando-a uma informante –numa cultura onde os policiais são
vistos com mais desconfiança do que os criminosos enraizados em suas tradições.
Damiani conduz essa
narrativa árida com foco pleno de admiração em sua estóica heroína, de uma
postura altiva que remete a “Joana D’Arc” –e Ornella Muti do alto de seus
tenros dezesseis aninhos de idade esbanja solidez em cena, tirando de letra uma
personagem que poderia representar uma armadilha como intérprete e resultar no
ponto fraco do filme; quando, na realidade, acaba sendo exatamente seu grande
trunfo.
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