Ainda na década de 1960, os italianos Mario
Giuseppe Girotti e Carlo Pedersoli começaram a estrelar, em colaboração,
exemplares de faroeste spaghetti. A obra que marca o início dessa parceria é
“Deus Perdoa... Eu Não!” que, similar aos ‘spaghetti’ realizados no período,
era sério e violento, dissonante da pegada mais cômica que passou a predominar
nos filmes que os dois protagonizaram depois. Sob os pseudônimos artísticos de
Terence Hill e Bud Spencer, o sucesso e o carisma da dupla deu tão certo que
eles passaram a estrelar filmes consecutivamente, alguns ainda de faroeste,
outros de aventura, ação, policial... todos temperados com doses generosas de
comédia, num viés que atraia um vasto e variado público para os cinemas.
Com o tempo, os projetos deixaram as
características iniciais para acomodar tramas mais pueris que servissem de
moldura à sempre simpática sintonia entre os dois.
Datado já dos anos 1980, a aventura “Quem
Encontra Um Amigo, Encontra Um Tesouro” atende a essas demandas, o que,
trocando em miúdos, significa menos brilho autoral da parte da execução e mais
uma fórmula escapista seguida à risca, que consistia de situações nas quais os
protagonistas deitavam e rolavam com seu humor peculiar, suas trapalhadas já
tornadas inofensivas e a premissa onde basicamente se encontravam, por uma
razão qualquer, formavam uma parceria hesitante aos trancos e barrancos, e
terminavam prevalecendo sobre os valentões da vez, sempre ostentando
malandragem astuciosa da parte de Terence Hill e implacável força física da
parte de Bud Spencer.
E se tal fórmula funcionou muito bem por quase
três décadas, quem sou eu para reclamar?
Terence Hill, aqui, é Alan, um apostador de
corridas de cavalos não muito favorecido pela sorte: Já no princípio do filme,
ele tem em seu encalço um punhado de apostadores lhe cobrando o dinheiro que
lhes deve. Em fuga, Alan acha bem propício aproveitar o ensejo de que seu tio
Brad (Herbie Goldstein), um veterano da Segunda Guerra Mundial, andou delirando
e desenhando um mapa de um suposto tesouro que só ele dizia saber a
localização, para partir dali, em busca da riqueza e para longe de seus
credores.
Ele acaba se escondendo dentro do barco à vela
de Charlie (Bud Spencer) velejador financiado por uma marca de marmelada –cuja
camiseta ele usa o filme todo –para empreender uma viagem ao redor do mundo
como forma de divulgar o produto.
A primeira quase meia hora de filme se
restringe ao interior do barco de Charlie e, mesmo assim –prova da
funcionalidade plena do carisma de seus astros –funciona: Charlie começa a
suspeitar de um clandestino a bordo quando toda comida que prepara desaparece
assim que, por qualquer razão, acaba virando as costas (as piadas envolvendo
comida e glutonaria que são comuns em todos os filmes deles).
Quando Alan é descoberto, ele apela para o bom
coração de Charlie para que não seja abandonado no mar, e passa a atuar como
seu funcionário a bordo da embarcação, contudo, Alan tem seus próprios planos:
Ele sabota a bússola do barco e traça sua própria rota a partir do mapa de seu
tio. Quando Charlie enfim descobre a travessura de seu colega, eles já estão
próximos da tal ilha do tesouro, e resta aos dois ir até o fim nessa procura.
Quando o filme chega à tal ilha –na verdade, a
Baía de Biscayne, na Flórida, onde as filmagens foram feitas, e que não lembra
em nada uma ilha selvagem (!) –as coisas esfriam um pouco: O humor ganha ares
mais infantilizados, as piadas se tornam menos ágeis e mais burocráticas, e a
narrativa passa a enrolar com algumas situações –inclusive com os clichês
batidos de índios e piratas!
Além disso, a dupla encontra um soldado japonês
(John Fujioka) crente que a Segunda Guerra Mundial ainda estava em curso (!)
–teria este personagem inspirado o de John C. Reilly em “Kong-A Ilha da Caveira”? –e, por conta disso, ainda protegendo o tesouro, milhões de dólares
em dinheiro confiscado pela marinha do Japão.
Era provável que um pouco mais de seriedade no
tratamento da premissa viesse a valorizar ainda mais os lances de humor quando
eles acontecessem, no entanto, o diretor Sergio Corbucci, já conhecedor dos
meandros que norteavam as realizações da dupla, arma o espetáculo no piloto
automático, deixando seus dois protagonistas brilharem. As cenas elaboradas no
roteiro servem somente ao humor no qual eles se especializaram, e pouco se
disfarça dos rumos bastante previsíveis que tudo acaba adquirindo –era o cinema
comercial trocando o audacioso pelo confortável (e até hoje, convenhamos, ainda
é feito assim).
Não é o melhor trabalho da
dupla, mas na contabilidade de seus acertos, e na graça genuína que obtém sendo
aquilo que é, ele certamente tem seu valor.
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