sexta-feira, 3 de julho de 2020

A Vingança dos Nerds

Vulgar, debochada e com frequência deliberadamente patética, a comédia “A Vingança dos Nerds” foi muito marcante para os jovens que cresceram assistindo aos besteiróis dos anos 1980; herança de um esforço criativo em tentar superar o escracho de comédias icônicas da década anterior –como o genial “Clube dos Cafajestes” –o filme, de 1984, dirigido por Jeff Kanew (que, um ano depois, realizou outro clássico oitentista da ‘sessão da tarde’, “Gotcha-Uma Arma do Barulho”, também com Anthony Edwards) não economiza no machismo, no estereótipo para além do tolerável e do ofensivo –e nesse balaio entram tanto os mocinhos apatetados quanto os vilões caricatos –no sexismo e no retrato politicamente incorreto do bullying –sempre usado para efeitos cômicos.
Em seu primeiro dia rumo ao campus universitário, os grandes amigos Gilbert (Anthony Edwards) e Lewis (Robert Carradine) mal são capazes de conter sua empolgação: Eles creem que o início de sua vida universitária será um caminho glorioso para o sucesso e a realização.
Ledo engano: Ao lá chegarem, eles são taxados, como tantos outros excluídos, como os nerds do lugar que, para nos ater aos personagens realmente relevantes à trama são: O porcalhão Booger (Curtis Armstrong), o ingênuo e oriental Takashi (Brian Tochi), o efeminado Lamar (Larry B. Scott), o pra lá de estranho Arn Poindexter (Timothy Busfield) e o garoto prodígio de 12 anos (!) Wormser (Andrew Cassese) –e, se você é jovem demais para saber, nos anos 1980, os nerds não eram aceitos, sobretudo, no âmbito estudantil, e sofriam desprezo e discriminação.
É lógico que o filme de Jeff Kanew, em seu humor de porta de banheiro, leva essa perseguição à um outro nível de absurdo.
Graças a uma brincadeira tremendamente imprudente (incendiando cortinas ao brincar de cuspir fogo!), os esportistas valentões da fraternidade Alpha Beta têm sua casa destruída pelo fogo. Sem terem onde dormir, o passivo diretor da universidade acata a inadmissível sugestão do treinador igualmente valentão dos Alpha Beta (interpretado por um ainda jovem John Goodman): Expulsar os nerds do dormitórios onde vivem.
Dessa forma, serão Lewis, Gilbert e sua turma quem terão de arcar com a perda de sua morada e dormir em leitos provisórios montados no ginásio local.
Os nerds, no entanto, correm atrás do prejuízo. Eles encontram uma casa no campus onde podem enfim ter um lar para morar; não têm, porém, sossego: O bullying dos Alpha Beta continua. Como o conselho estudantil é dominado por eles e pelas patricinhas Irmãs Pi, tentar denunciá-los é inútil, a menos que eles se tornem uma fraternidade também.
A única casa que os aceita é a segregada –por antiquadas questões raciais –Lambda Lambda Lambda e, para causar boa impressão, os nerds tratam de promover uma festa e, depois, provar valentia dando o troco às Irmãs Pi –colocando câmeras em seus dormitórios e roubando suas calcinhas, o que dá a deixa para as inevitáveis (e extasiantes) cenas de nudez –e aos Alpha Beta –sabotando seus calções de treinamento com produtos urticantes!
Contudo, a desforra definitiva dos nerds injustiçados será no Campeonato de Homecoming, o qual, se eles ganharem, terão a oportunidade de presidir o conselho no ano seguinte.
Quanto mais o tempo passa –e quanto mais as transformações culturais moldam os valores e os comportamentos de nossa sociedade –mais curioso se torna assistir, nos dias de hoje, filmes feitos décadas atrás, como este daqui; “A Vingança dos Nerds” é capaz de surpreender alguns expectadores mais jovens e desavisados com o tratamento despojado que dedica à dinâmica do sofrimento estudantil adolescente, aqui visto com galhofa, sarcasmo e sem um pingo de seriedade, nem mesmo por aqueles que eram vitimados –mais do que trazer predicados artísticos e técnicos (os quais deixam algumas vezes a desejar), o filme de Jeff Kanew é um perfeito exemplar daquela leveza escatológica que permeava os valores daquela época (e por isso, talvez, tenha se tornado para muitos o pseudo-clássico saudosista que é) onde nenhum drama, mal-trato ou prejuízo era demais inapropriado para ocupar o tema de uma boa piada.
E, se com esse enredo, “A Vingança dos Nerds” ainda termina num apoteótico desfecho ao som de “We Are The Champions”, tanto melhor!

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