quarta-feira, 3 de fevereiro de 2021

As Idades do Amor


 Na tradição italiana de filmes em formato episódico, este trabalho do diretor Giovanni Veronesi apresenta três histórias, interligadas por irônicos momentos a conectar seus protagonistas, por um mesmo e onipresente personagem –um cupido disfarçado de motorista de táxi, interpretado pelo jovem Emanuele Propizio –e pelo tema recorrente da paixão, um ingrediente, também ele, de sabor inconfundivelmente italiano.

Assim, ao longo das três narrativas –engendradas de forma um tanto pedante pela frouxa condução –visitamos três diferentes fases da vida na qual o amor encontra caminhos inesperados para se expressar. Na primeira deles, “Juventude”, acompanhamos o casal Roberto (Riccardo Scamarcio, de “John Wick-Um Novo Dia Para Matar”) e Sara (Valeria Solarino), na flor da idade e prestes a se casar.

Roberto está apaixonado por Sara, entretanto, suas convicções sofrem um forte abalo quando parte para uma cidadezinha excêntrica na Toscana a fim de convencer proprietários a deixar um terreno reclamado por sua empresa, e lá conhece a impulsiva cantora Micol (Laura Chiatti, de “Um Lugar Qualquer”), uma espécie de musa do local, com quem todos os homens, novos e velhos, sonham ir para a cama.

Aos poucos, as circunstâncias vão aproximando Roberto de Micol e, tomado por desejo, ele vai protelando sua partida da cidadezinha que antes só lhe infernizava.

A ambivalência moral que precisava ostentar no âmbito profissional –onde representa um corporação disposta a expulsar camponeses do lugar onde moraram a vida toda –começa a interferir em sua decisão de se manter fiel à própria noiva, levando-o ao adultério e até a cogitar uma vida ao lado de Micol. Pelo menos, até o destino surpreendê-lo...

Na segunda parte, “Maturidade”, um tanto quanto mais divertida e sarcástica –a ponto até de afastar-se do conceito de romantismo inicialmente sugerido e mergulhar numa comédia mais rasgada –encontramos um vaidoso âncora de telejornal de meia-idade, Fabio (o hilário e irrequieto Carlo Verdone, de “A Grande Beleza”) que encontra, numa festa, uma mulher aparentemente fascinante, a psiquiatra Eliana Rame (Donatella Finocchiaro), que de começo já lhe derruba dentro da piscina local (!).

Uma carona aqui, um telefonema e um convite para um café ali, e Fabio já está no apartamento dela, traindo a esposa com quem o casamento caiu num certo marasmo. Mas, Fabio mal sabe a encrenca em que se meteu: Ao parar, acidentalmente numa delegacia, ele descobre que o nome real dela é Gaia (Eliana Rame é sua psiquiatra!) e que ela sobre de transtorno bipolar (!).

Agora, a mulher sedutora que inicialmente convenceu-o a mudar de atitude, num gatilho para alguma crise de meia-idade –ele chegou até a abolir os apliques de cabelo para apresentar, orgulhoso, as reportagens com sua careca natural! –converteu-se num pesadelo: Ela o persegue, obcecada em ter um filho seu, e para isso, vira sua vida do avesso!

Além de ser o melhor episódio, a terceira e última parte, “Mais Além”, beneficia-se do carisma do grande Robert De Niro e da espetacular Monica Bellucci: Ele vive Adrian, um americano que mudou-se para Roma (falando italiano fluentemente) e que, após uma viuvez e um transplante do coração, passou a encarar a vida com certa desilusão.

As tentativas do amigo Augusto (Michele Placido) em conseguir arranjo com as vizinhas são recebidas por ele com niilismo. Isso pelo menos, até Augusto ser visitado pela filha, Viola (Monica), vinda de Paris onde tinha ido morar.

Fascinado pela beleza dela, Adrian acaba descobrindo seus problemas; Viola trabalhava de stripper e deve dinheiro à agiotas, o que leva seu pai, indignado, a expulsá-la de casa. É Adrian quem a acolhe em seu apartamento, às escondidas de Augusto e, às vésperas do Dia da Marselha, a paixão termina por envolvê-los, mesmo que Adrian, naquele ponto da vida, já não tivesse maiores expectativas quanto a um envolvimento profundo com uma mulher.

Agradável na maior parte do tempo –o que se comprova visto que suas mais de duas horas passam sem maiores sofrimentos –“As Idades do Amor” é beneficiado pelo detalhe, talvez involuntário, de que não só suas histórias estão dispostas em ordem crescente de qualidade, como também as razões que as fazem interessantes parecem mais acidentes felizes do que competência de fato da parte dos realizadores: A primeira diverte na mesma medida que injuria, mas é bem curta; a segunda se torna engraçada graças aos esforços do grande ator Carlo Verdone e sua perplexidade cada vez mais incontida; e a terceira seria só mais uma trama enfadonha de romance entre indivíduos de diferentes idades, não fossem as presenças luminosas de De Niro e Monica. E isso basta para torná-la envolvente do início ao fim.

Para constar, este “As Idades do Amor” lançado em 2011 é, na verdade, o terceiro de uma série de filmes realizados pelo diretor Giovanni Veronesi; os anteriores foram “Manuale D’Amore”, de 2005, e “Manuale D’Amore 2-Capitoli Successivi”, de 2007, que também abarcam vários episódios (quatro cada um) girando em torno de enredos românticos, e muitos repetem parte do elenco deste filme (Monica Bellucci, inclusive, participa do segundo). Dentre os três, somente“As Idades do Amor” –ou “Manuale D’Amore 3” –e o primeiro, “Manual do Amor”, foram lançados no Brasil.

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