Vencedor do Oscar 1994 de Melhor Filme Estrangeiro, por “Sedução”, o diretor espanhol Fernando Trueba fez sua estréia norte-americana por meio de caminhos comercialmente viáveis –saiu-se já de cara com uma comédia –e trouxe a tiracolo um astro latino (Antonio Banderas) com o qual provavelmente teria mais compatibilidade durante a produção do que um ator americano.
“Quero Dizer Que Te Amo” deleita-se com a
situação de farsa que predomina nesse subgênero específico das comédias, de
“Quanto Mais Quente Melhor” até “Tootsie”; no entanto, o que se sucede em cena
não é um protagonista se travestindo, mas sim se multiplicando em dois (!).
Art Dodge, personagem de Banderas, é dono de
uma galeria de arte em Miami. Sua técnica é ir até velórios e explicar, com a
cara mais lavada do mundo, que o falecido comprou-lhe um quadro na semana
anterior, levando os familiares a pagar-lhe o valor da obra a partir do
benefício da dúvida. Nota-se aí, a predisposição ao embuste de Art.
Todavia, ele mete-se em maus lençóis quando o
falecido em questão, no golpe que decide aplicar, é pai de um gangster pouco
avesso à amenidades, o colérico Gene (Danny Aiello). Para escapar da encrenca
com a pele intacta, Art termina de carona no carro de Betty (Melanie Griffith),
ex-esposa de Gene, com quem Art acaba tendo um affair passageiro. Ou, ao menos, ele julgava que seria passageiro:
De um dia para o outro, a impulsiva e inconsequente (e à propósito rica...)
Betty decide que vai se casar com Art, sem lá muito perguntar a opinião deste.
Mas, Art conhece a irmã dela, Liz (Daryl Hannah), completamente diferente, mais
centrada e mais ajuizada que a outra, e por ela se apaixona.
Como, porém, conseguir almejar algum romance
real com a iminente cunhada proibida, se ela, ainda por cima, não o suporta e o
enxerga como um aproveitador barato?
A saída é inventar um irmão gêmeo fictício,
Bart (!), e embora o truque se resuma a Art soltar os cabelos presos por
rabo-de-cavalo e colocar um par de óculos, a manobra dá surpreendentemente certo,
chegando a quase convencer até mesmo seu pai (!) meio senil, Sheldon (vivido
com graça e descontração pelo veterano Eli Wallach).
No papel de Bart, o protagonista consegue assim
conquistar o coração da até então inacessível Liz, desempenhando o papel de
artista engajado que corresponde a ela –na verdade, o próprio Art era um
artista frustrado que adotou a malandragem diante de suas desventuras.
O grande problema de Art, no entanto, é a
autenticidade de seus sentimentos: Ele se apaixona de fato por Liz, ainda que a
data de seu casamento com a irmã avoada, Betty, vá rapidamente se aproximando
–e o truculento Gene, ainda apaixonado por Betty e disposto a fazê-la feliz de
qualquer maneira, não aceitará ver Art dando o fora nela sem fazer com que
pague muito caro por isso!
Herdeiro a um só tempo das comédias italianas
(e européias em geral), e das ágeis screwball
norte-americanas (todas inspirações para esta obra, não há dúvidas), o filme de
Trueba prioriza o humor ao romance, a despeito do cerne ser, o tempo todo, seu
triângulo amoroso; para tanto, há espaço de sobra para que brilhem os atores
coadjuvantes magistrais (como a secretária vivida pela sempre sensacional Joan
Cusack, que esteve com Melanie em –veja só! –“Uma Secretária de Futuro”) e para
que se note, em boa luz, o timing cômico impagável de Banderas, até então
soterrado em projetos norte-americanos que buscaram vendê-lo como o estereótipo
do amante latino no cinema.
Foi nesta produção charmosa e agradável –ainda
que ocasionada por certa redundância corriqueira –que Banderas e Melanie se
conheceram vindo a se casarem poucos meses depois. Com efeito, percebe-se
nitidamente que a química dele com Melanie flui muito melhor do que com Daryl
Hannah –o par romântico de fato –o que agrega ao filme um ligeiro desequilíbrio
em sua condução e nas impressões passadas ao expectador.
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