Nascido durante o revisionismo do faroeste acometido nos anos 1960 e 70, “Butch Cassidy & Sundance Kid” é um trabalho sólido em relação à sua proposta e à sua categoria. Ao abordar a história real da Gangue do Buraco na Parede –com ênfase, evidentemente, em seu líder e seu braço-direito –o roteiro de William Goldman fala sobre a própria transformação do gênero enquanto cinema.
Os créditos iniciais de “Butch Cassidy” surgem
em meio a um filme de tom sépia, ao estilo do cinema mudo, flagrando com
galhofa agridoce e silenciosa as desventuras do bando liderado por Butch
Cassidy (Paul Newman). O próprio Butch é introduzido na cena seguinte, uma
sequência cheia de cortes rápidos, claustrofóbica até, onde o assaltante de
bancos se dá conta dos novos obstáculos proporcionados pelo avanço tecnológico
ao seu ofício: Alarmes, fechaduras mais eficientes, cofres mais resistentes. O
progresso dificulta a vida do fora-da-lei, e ele lamenta.
Sundance Kid (Robert Redford), seu fiel
parceiro, é apresentado logo depois, numa cena de orientação absolutamente
oposta (indicativa da índole distinta de ambos): Um espaço mais aberto e mais
iluminado (uma mesa de bar onde uma partida de cartas se segue), quase um único
take a acompanhar toda a ação; A boa sorte de Sundance desperta as
desconfianças de seu adversário que ameaça iniciar um duelo, no entanto, a fama
de pistoleiro implacável de Sundance logo drena a coragem do oponente.
Esses são, pois, os protagonistas do filme que
se segue –cujas cores na direção de fotografia vencerado do Oscar surgem logo
após essas duas cenas. No ponto em que a trama de fato começa, a Gangue do
Buraco na Parede já se encontra fragmentada. Rixas internas e a constatação
geral da vida cada vez mais árdua de assaltante baixaram o moral do grupo.
Ainda assim, a entusiasmada liderança de Butch os convence a mais alguns
golpes. Durante um assalto a um trem, contudo, Butch e Sundance descobrem um
grupo, financiado pelo dono da transportadora, para que os peguem a qualquer
custo. O rastreador deles tem uma capacidade sobrehumana de descobrir a trilha
dos fugitivos, e essa perseguição que se estende por dias –e da qual escapam
por um triz –leva Butch, Sundance e Etta (Katharine Ross), a namorada dos dois
(!), a arrumar as malas em direção ao leste.
Todavia, os planos de Butch e Sundance não
envolvem sossegar: Homens selvagens e indomáveis, eles cultivam a ideia de
procurar ação nas guerrilhas que se desenrolam no México, onde haverão de
encontrar meios para enriquecer, sem perceber que essa predisposição
aventureira os conduz ao próprio fim.
Embora a química da dupla principal transborde
carisma e bom-humor –não raro, transfigurado em cenas descontraídas como o
passeio de bicicleta, ao som da canção vencedora do Oscar, “Raindrops Keep
Fallin’ On My Head” –há, na narrativa de “Butch Cassidy”, um viés
primorosamente evidente da amargura em perceber o tempo passar: Isso surge
tanto em momentos de constatação (os cofres do trem, que agora suportam até
suas cargas de dinamite), como de indignação (quando, mais tarde, Butch se
livra da bicicleta, descontando nela seu rancor pela tecnologia que vem pra
complicar sua vida) e até de certo sarcasmo (quando, ao tentar prejudicar seus
perseguidores, ele tenta soltar seus cavalos e os animais, mais inteligentes, não
arredam o pé de onde foram deixados).
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