Em 1987, o falecido diretor Lael Rodrigues finalizou sua assim chamada “Trilogia do Rock Nacional” com “Rádio Pirata”, encerrando o projeto onde almejou lançar um olhar descontraído, despido de preconceitos e carregado de um certo romantismo àquela geração de jovens, aos seus anseios, expectativas e angústias –impressões hoje que são extraordinariamente distintas da geração atual. O primeiro filme, “Bete Balanço” falava sobre a busca de uma jovem garota por um lugar ao sol na dicotomia esmagadora de uma metrópole onde entrecruzavam-se amores, interesses e desilusões. O segundo, “Rock Estrela”, executava manobra narrativa muito parecia, com a diferença de emoldurar com essa dramaturgia um protagonista do sexo masculino. Talvez, em resposta a possíveis críticas do segundo filme –que certamente apontaram de forma rabugenta a semelhança redundante entre os dois primeiros filmes –Lael Rodrigues fez deste terceiro o enredo mais diferenciado dos três.
Tecnicamente superior (isso se nota inclusive
no uso menos hesitante de cenas de ação, embora a técnica de aceleração de
quadros numa cena de perseguição ofereça uma sensação mambembe), “Rádio Pirata”
conta a história de uma tentativa revolucionária de denunciar uma prática corrupta
do governo, realizada por um grupo de jovens ao usar um sinal de rádio pirata
instalado num automóvel (!). À esse grupo, junta-se o jovem técnico de
informática Pedro (Jayme Periard), disposto a expor e combater as injustiças
flagradas na crise política do Rio de Janeiro (e do Brasil) do período de então,
após descobrir um vazamento de informações sigilosas na empresa em que
trabalhava, junto de um amigo. Há, portanto, um esboço de intriga política a
movimentar a trama, não sem um certo verniz de romantismo que parecia tão
inerente àquela geração, e que pareceu ser uma das características do diretor
Lael Rodrigues, visto sua ênfase na trilha sonora.
Apesar desse filtro de idealização juvenil –a
cercar tudo com uma atmosfera pueril, fazendo os jovens revolucionários soarem
mais como crianças indignadas do que como ativistas conscientes –“Rádio Pirata”
deixa evidente, nas situações esboçadas em seu roteiro, a pertinente intenção
de tratar a realidade do país, afastando-se dos contos de fadas que
prevaleceram nos filmes anteriores: Ainda que o enredo não evite ao menos uma
pequenina concessão: O romance ocasional, fortuito e quase lúdico a cercar o
protagonista e a personagem de Lídia Brondi (bela e apaixonante, possivelmente
a melhor coisa do filme), Alice, que encabeça o desvairado grupinho jovem que
transforma o flagra governamental em um escândalo nacional.
Válido na sua tentativa de emplacar uma
realização que englobasse ação (ainda que titubeante), suspense (ainda que nem
sempre convincente) e um conceito político mais engajado (o que, apesar de suas
limitações indica a disposição do diretor em tentar evoluir seu cinema), e sensacional
no registro da década de 1980 que emprega em sua melodia e atmosfera, “Rádio
Pirata” termina ostentando uma série de imperfeições oriundas justamente de sua
própria tentativa de inovar; algumas cenas que se pretendem alegóricas (como a
do grupo de teatro) soam risíveis e constrangedoras. Suas qualidades residem no
aperfeiçoamento da execução de facetas que já tinham funcionado nos filmes
anteriores; a fotografia bem-cuidada e
estilizada, e a trilha sonora, aqui usada com mais economia, mas ainda assim
capaz de entregar momentos um tanto quanto memoráveis, como a conhecidíssima
faixa-título cantada pelo RPM, e a emblemática e marcante sequência final
executada com primor por Marina Lima.
Nenhum comentário:
Postar um comentário