segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

Ou Tudo Ou Nada


 Dentre os indicados ao Oscar 1998 –de onde saiu vitorioso um imbatível “Titanic” –chamava a atenção, justamente por sua simplicidade, um projeto britânico singelo, pequeno, autoral e humilde que, com todas essas características, conquistou o coração da crítica em sua época: A comédia “Ou Tudo Ou Nada”.

Sem astros, sem pirotecnia, sem megalomania ou situações grandiloquentes, restava a este filme, conduzido com serenidade pelo diretor Peter Cattaneo, abordar o homem comum em suas fraquezas e inseguranças cotidianas, e nessa proposta, ele encontrava o árduo caminho para divertir e, quem sabe, emocionar.

Iniciando sua narrativa com um documentário sobre a cidadezinha siderúrgica de Sheffield, na Inglaterra, “Ou Tudo Ou Nada” expõe, com ironia tipicamente inglesa, o otimismo depositado, na década de 1970 e 80, na produção de ferro e aço do lugar, negócio que trará prosperidade `região. No corte seguinte, quando o filme de fato se inicia, algumas décadas se passam e a realidade provou-se outra: Sheffield é uma cidadezinha desolada, suas fábricas já não produzem a contento e seus operários amargam a pobreza, a falta de ocupação e o desemprego. Entre eles está Gaz (Robert Carlyle, num personagem simpático, completamente diferente do tipo psicopata que o revelou, um ano antes, em “Trainspotting”), um proletário com filho para criar, sem saída para a necessidade de por comida na mesa sem qualquer esperança de ter dinheiro no bolso; a mesma situação é a de David (Mark Addy), cujo casamento com Mandy (Emily Woof) não vai tão bem, embora não lhe falte amor.

Desde o início, essa é a grande proposta da obra de Cattaneo: Um olhar carinhoso e circunspecto sobre o homem comum, suas aflições e carências –e esse olhar adquire mais particularidade quando entra nele um elemento de sarcasmo; na penúria, Gaz tem a ideia de juntar alguns amigos e realizar, para as freguesia feminina da região, um show de striptease. O detalhe: Enquanto que os strippers profissionais, sarados, bonitões e definidos realizam um striptease, digamos, parcial –eles tiram a roupa até ficarem só de cuecas (!) –o grupo de Gaz irá oferecer o diferencial de se despir completamente; o ‘tudo ou nada’, ou “The Full Monty”, de seu título original. Assim, o grupo de desesperados strippers de araque, montado por Gaz, inclue, além dele próprio e de David, o mal-humorado Gerald (Tom Wilkinson); o magrelo Guy (Hugo Speer), capaz, segundo ele próprio, de executar um salto mortal numa parede (pura bravata!); o tímido e retraído Lomper (Steve Huison) e o desamparado Horse (Paul Barber) que é aceito no grupo sobre a alegação de que suas partes baixas têm tamanho descomunal (outra bravata!).

No entanto, irão esses desengonçados e envergonhados indivíduos comuns levar essa ideia até o fim? Peter Cattaneo explora as nuances dessa premissa até o seu desfecho, colocando em foco justamente aquilo que, com frequência, falta nos blockbusters norte-americanos: A humanidade de seus protagonistas.

Se “Ou Tudo Ou Nada” não chega a ser uma comédia das mais hilárias, ele acaba sendo uma obra agridoce, ao dividir-se entre um riso mais tocante e a observação comovente das inseguranças de seus personagens –e nesse sentido, quem se sobressai é o personagem de Mark Addy, o mais humano e identificável, no complexo de inferioridade que rumina por seu físico rechonchudo –na contramão do humor habitualmente auto-depreciativo dos ingleses.

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