domingo, 11 de setembro de 2022

Alfie - O Sedutor


 Na cerimônia de 2000, durante o agradecimento por seu Oscar de Melhor Ator Coadjuvante por “Regras da Vida”, Michael Caine citou, entre outros, o jovem colega Jude Law, que à época concorria com ele por seu papel em “O Talentoso Ripley”, afirmando que Law se parecia muito com ele quando mais jovem. Talvez tenha sido um tremendo acaso do destino –ou talvez os produtores desse filme estivessem assistindo à cerimônia... –mas, anos depois, foi o próprio Jude Law quem acabou escalado para reprisar o papel de Alfie Elkins, que havia sido de Michael em 1966 (e pelo qual ele recebera uma indicação ao Oscar de Melhor Ator) no filme “Alfie” –aqui no Brasil intitulado “Como Conquistar As Mulheres”.

Se não chega nem perto de igualar a qualidade, nem tampouco a relevância pulsante com que abordou elementos pertinentes e delicados referentes à revolução sexual e aos novos comportamentos de então, o novo filme serve, ao menos, para uma interessante avaliação da mudança dos tempos, no curioso contraste que se estabelece entre ele e o clássico original –e mesmo entre as circunstâncias que lhe tiram a contundência –e, queira ou não, ele vale a pena ser visto, também, pela convicta e certeira presença de Jude Law. Nisso, Michael Caine estava coberto de razão: Provavelmente poucos atores jovens em geral (e ingleses em particular) seriam capazes de se equiparar em apelo e competência ao desempenho que Caine entrega no filme de 66; no que diz respeito ao seu protagonista, pelo menos, este “Alfie-O Sedutor” se revela tão certeiro quando o clássico.

Uma pena que todo o resto não siga essa vibração: Motorista londrino de limusines descompromissado e galanteador, Alfie (Jude Law, numa segurança à toda prova) é um rapaz que se dá bem até demais com o sexo oposto. Sua rotina é enfileirar conquistas sistematicamente ao longo das noites de balada enquanto narra, no processo, suas aventuras românticas ao expectador, num tom de confissão/reflexão.

Todavia, a compulsão de Alfie por encontros casuais migra, aos poucos, de relações superficiais e basicamente físicas (como atestam as participações rápidas, porém descontraídas de Marisa Tomei, Sienna Miller e Jane Krakowski), para complicações afetivas e sentimentais para as quais ele não estava preparado –caso da recaída na qual Alfie seduz a namorada de um grande amigo. Se no filme original, neste momento –o ponto de virada da trama, digamos assim –o filme original confrontava o público e o personagem principal com um choque de realidade ao trazer, inclusive, uma perturbadora reconstituição de um aborto, o filme de 2004 prefere não pegar tão pesado assim. Ele abraça as intenções mais comerciais e menos sócio-comportamentais ao optar por uma solução onde, desta vez, o aborto não ocorreu, substituído por uma gravidez-surpresa. A tragédia que fica a definir o ponto de virada do protagonista é então uma amizade perdida por conta de sua compulsão por mulheres.

Com efeito, essa disposição de possuir menor contundência e menos ousadia se reflete diretamente no filme: “Alfie-O Sedutor” é prosaico onde o original era pungente; vai de uma comicidade colorida e cheia de flertes (na qual Jude Law se sai muito bem) para uma insossa seriedade forçada, quando o original afastava o público gradualmente do humor inconsequente para um drama avaliativo.

Em suma, a troca da década de 1960 para os anos 2000, drenou a urgência e a necessidade narrativa de expor arestas sociais varridas para debaixo do tapete tão presente (e tão fundamental) em um filme daquele período, para evidenciar a acomodação e até mesmo uma certa alienação por parte da geração subsequente. Até mesmo o desfecho semelhante ao de 66 –onde Alfie, enfim acometido de uma disposição súbita para dividir sua vida com uma mulher (no caso, a belíssima e sedutora Susan Sarandon), acaba descobrindo que foi trocado por outro alguém mais jovem, como ele próprio fez com outras mulheres –parece surgir como uma concessão afetiva e comportamental nesses tempos em que estar sozinho é melhor que estar mal-acompanhado.

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