domingo, 16 de junho de 2024

Sasquatch Sunset


 De tempos em tempos, o cinema independente norte-americano se sai com uma obra verdadeiramente diferente e desconcertante. Se há parâmetro para “Sasquatch Sunset” do que já foi feito no cinema moderno, certamente seria a primeira parte de “2001-Uma Odisséia No Espaço” –intitulada “A Aurora do Homem” –o filme “Guerra do Fogo” e o pseudo-documentário “O Elo Perdido”. Em todos eles, há uma retrato de estágios pré-históricos do ser humano, onde atores imersos em uma prodigiosa maquiagem desaparecem para dar lugar à criaturas assombrosas em sua autenticidade. Se nos demais exemplos tínhamos variações entre macacos e homens das cavernas, aqui, no filme dirigido por Nathan Zellner e David Zellner, e co-produzido por Ari Aster, temos uma família de Sasquatchs –para quem não sabe, o Sasquatch é um criatura lendária, um símio gigantesco com propriedades humanas supostamente habitante de áreas remotas entre os EUA e o Canadá, também conhecido como Pé Grande.

Embora sua existência nunca tenha sido comprovada, o filme acompanha, durante cerca de um ano (e dividido em capítulos que levam o nome das estações, “Primavera”, “Verão”, “Outono” e “Inverno”), num tom a um só tempo lírico e documental, a jornada de vida de toda uma família dessas criaturas, composta de uma fêmea e três machos. A fêmea é vivida por Riley Keough (de “Mad Max-Estrada da Fúria”), os machos dividem-se entre o Alfa (Nathan Zellner, um dos diretores), frequentemente interessado somente em se alimentar e acasalar (!), e os outros dois, interpretados por Jesse Eisenberg e Christophe Zajac-Denek (esse último, talvez, seja um filho já crescido da fêmea).

O filme prescinde de diálogos, narração em off ou qualquer informação falada, são as imagens e a encenação naturalista que contam a história. Em “Primavera” testemunhamos o avanço a esmo dos quatro Sasquatchs pelas florestas, à procura de comida e ocasionalmente abrigo. É numa súbita imprudência de Alfa que ele se depara com um puma, e acaba trucidado –após sua morte, os Sasquatchs demonstram curiosa inclinação humana ao enterrá-lo numa espécie de cova.

Em “Verão”, os três restantes seguem uma peregrinação nômade até começarem a se aproximar da civilização humana –suas reações com a descoberta de uma estrada asfaltada, por exemplo, é um momento carregado de assombro e escatologia (os Sasquatchs gritam, mijam e defecam tentando demarcar seu território!). Na beira de um rio, ao se ocupar inadvertidamente com um tronco de madeira ali deixado, um deles (aquele vivido por Jesse Eisenberg) acaba preso sob as águas, o que, a despeito dos esforços dos outros dois em libertá-lo, acaba levando-o ao afogamento e à morte.

Em “Outono”, a fêmea dá à luz um filhote, fruto dos interlúdios experimentados com Alfa durante a primeira parte. E em “Inverno”, esses membros sobreviventes do grupo se deparam com cada vez mais proximidade e perigo (embora eles não se deem conta) das áreas habitadas pelos humanos, cujos utensílios e indícios encontrados aqui e ali, despertam reações desconcertantes nas criaturas.

Concebido a partir de um curta-metragem (“Sasquatch Birth Journal 2”, de 2011) também ele realizado pelos Irmãos Zellner, “Sasquatch Sunset” se beneficia de primorosas execuções nas áreas de direção de fotografia (de Michael Gioulakis, também fotógrafo de “It Follows”) e de trilha sonora (a cargo do The Octopus Project) que, em conjugação, moldam imagens hipnóticas que capturam a atenção durante toda a duração. É certo, entretanto, afirmar que o filme, devido ao seu caráter assumidamente bizarro e incomum, dificilmente agradará expectadores de paladar convencional.

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