Na carreira de Sandra Bullock, “28 Dias” é um corpo tão curioso quanto transitório. É uma obra que gera desconforto pela linguagem bastante ultrapassada de sua narrativa, dessas difíceis de vincular a uma estrela famosa. Ao mesmo tempo, conserva elementos capazes de sustentar a atenção do público –embora, no frigir dos ovos, esses elementos venham quase todos da presença de sua atriz principal.
Na transição dos anos 1990 para 2000, Sandra Bullock
já havia se consolidado como uma estrela do cinema. Quase que instantaneamente,
porém, ela experimentou os revezes de uma carreira acompanhada de perto por
milhões de fãs e por uma horda de interesseiros opinando à respeito: Na esteira
dos sucessos “Velocidade Máxima” e “Enquanto Você Dormia” –indiscutivelmente os
filmes que a levaram ao estrelato –ela emplacou, por sucessivas razões
distintas, fracassos como “A Rede” (uma mera escolha mau feita de projeto),
“Corações Roubados” (um péssimo filme do qual ela participou apenas por convite
de um amigo, o ator Denis Leary) e “Velocidade Máxima 2” (sem keanu Reeves, um
fracasso e um vexame homérico, até hoje a única produção da qual ela se
arrepende de ter participado). Convencida por esses tropeços de que deveria conduzir
de uma nova maneira sua carreira, Sandra abriu a produtora Fortis Films e
passou a interferir com maior autoridade nos filmes dos quais participava e,
embora os resultados verdadeiramente positivos tenham até que demorado a
chegar, ao menos, nos anos subsequentes, ela foi capaz de se desvencilhar de
fracassos.
“28 Dias” reflete a preocupação de Sandra,
enquanto estrela de cinema, em estar presente em obras de um mínimo de cunho
social e moral –o filme, dirigido por Betty Thomas, se debruça sobre os efeitos
colaterais do alcoolismo.
Gwen Cummings (Bullock) é uma moça de vida
social, digamos, ativa. Ela e seu namorado, Jasper (Dominic West, de “300”)
sabem pela noite nova-iorquina e, no decurso da bebedeira, aprontam até altas
horas da madrugada. Com o tempo, esse clico vicioso (embriagar-se, esquecer de
todas as confusões que fizeram e, no dia seguinte, começar tudo de novo) os
engole por completo. Ela só começa a ter uma tênue noção do prejuízo que seu
hábito etílico provoca em sua vida durante o casamento da irmã (Elizabeth Perkins),
no qual Gwen pega um carro alcoolizada e colide contra a varanda de uma casa.
A pena negociável, para Gwen escapar da cadeia,
é frequentar por vinte oito dias um centro de reabilitação e se livrar do vício
que –numa atitude comum –ela insiste não ter. Inicialmente arredia para com
tudo e para com todos (sobretudo com a tarimbada recepcionista, interpretada
por Margo Martindale e com o conselheiro –e ex-viciado –vivido por Steve Buscemi),
Gwen aos poucos vai tomando contato com a fauna de habitantes desajustados do
lugar e com eles, constrói um vínculo de inesperada amizade: Sua colega de
quarto Andrea (Azura Skye, de “EDTV”), viciada em heroína aos 17 anos de idade
e obcecada por um dramalhão folhetinesco que passa na TV; o outrora famoso
jogador de beisebol Eddie viciado em drogas e sexo (Viggo Mortensen, pouco
antes da revelação como Aragorn em “O Senhor dos Anéis”); o homossexual,
dançarino e neurótico contumaz Gerhardt (Alan Tudyk, de “Rogue One” e “Tucker
& Dale Contra O Mal”); a idosa e solícita Bobbie (Diane Ladd, de “Coração Selvagem”) e muitos outros.
A medida que redescobre quem é longe do efeito
intermitente da embriaguez, Gwen passa a se relacionar melhor com os outros à
sua volta –até mesmo na ressentida relação com a irmã –e se dá conta da
influência um tanto prejudicial e propícia ao vício de Jasper.
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