Para Krzysztof Kieslowski, a liberdade é de uma
abstração tal que perdê-la (ou mesmo recuperá-la) depende quase que
exclusivamente de um estado de espírito. Daí, talvez o fato de que este é,
dentre os exemplares da ‘trilogia das cores’, o mais intimista.
Em tons azuis onipresentes, de sussurro em sussurro,
testemunhamos um acidente de carro, e a longa, lenta e dolorida recuperação da
única sobrevivente: a personagem de Juliette Binoche. Logo, vamos descobrir que
ela, assim como o falecido marido, é uma musicista. E que o projeto incompleto
dele (uma composição em homenagem à Unificação Européia) ao parece, é uma
incumbência que cabe somente a ela terminar.
É, portanto, o processo de desvencilhar-se de
todas as prisões do luto a grande questão do filme. Justamente por isso pode
ser um pouco frustrante, para cinéfilos mais objetivos e desavisados, procurar
por um sentido relativo ao título (em português): A liberdade, por assim dizer,
não é um elemento que surge de forma literal na narrativa de Kieslowski.
Ela também não é a única.
Todos os princípios abordados ao longo da
trilogia aparecem nos filmes sem distinção. Ou seja, liberdade, igualdade e
fraternidade são questões discutidas nos três filmes. Mas, é claro que a
liberdade ganha um outro enfoque aqui. Os personagens, conduzidos por
Kieslowski, deixam-se distrair pelas banalidades cotidianas enquanto
marginalizam os momentos de significado, como o garoto no início, que ao
ocupar-se com um brinquedo, acaba vendo o acidente só depois que aconteceu. Ou
o torrão de açúcar, que captura de tal forma a atenção de Juliette, que todo o
resto ao redor lhe perde a importância.
Se há um fator de destaque, é a música (e não
poderia ser mesmo diferente num filme em que a protagonista exerce a música
como arte e como vocação), e isso abre espaço para Kieslowski trabalhar a
trilha sonora, fundindo-a com a música que surge em cena, em composições que os
personagens executam, ouvem, ou mesmo que idealizam em sua própria mente ao ler
uma partitura.
O mais triste dos
exemplares de sua trilogia, “A Liberdade é Azul” iniciou com pompa esse projeto
que Kieslowski abraçou nos anos 1990, e que terminou por marcar sua época.
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