Certos filmes são um testemunho à grandeza de
seus realizadores. E a filmografia desse grande Akira Kurosawa é, por vezes,
povoada por esse tipo de obra.
“Ran”, no qual ele logrou realizar uma variação
culturalmente japonesa para o conto moral e universal “Rei Lear”, de
Shakespeare, é um esforço cinematográfico de paixão e genialidade. Um
brilhantismo que pulsa de cada imagem que transcorre na tela.
Anos antes, o mestre já havia obtido recursos
para viabilizar seus projetos com ilustres fãs de seu trabalho (uns tais de
George Lucas e Francis Ford Coppola, que produziram, de bom grado, o magistral
“Kagemusha-A Sombra do Samurai), e o mesmo voltou a acontecer aqui. (E tornaria
a ocorrer novamente quando Lucas e Steven Spielberg uniria-se para produzir o
lúdico e personalíssimo “Sonhos de Kurosawa”)
Ran começa com uma caçada que depois se revela
quase como um pretexto para o grande lorde Hidetora reunir seus filhos e com
eles compartilhar uma decisão que tomou à luz do crepúsculo de sua vivência:
Dividir seu reino entre seus três herdeiros.
De início convicto, o ancião começa a tomar
contato com facetas de seu arranjo que não tinha previsto, sobretudo quando
alguns de seus filhos (influenciados e manipulados por suas mulheres)
demonstram características mesquinhas e rancorosas que antes o monarca não
havia percebido.
Logo, as intrigas palacianas moverão
engrenagens que levarão à guerra, e Hidetora, paradoxalmente à loucura.
Décadas antes o mestre já havia adaptado
Shakespeare, no igualmente colossal “Trono Manchado de Sangue”, mas o que ele
obtém com “Ran” é de uma excelência cinematográfica difícil de se equiparar,
até mesmo de descrever.
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