O diretor Stephen Hopkins (de trabalhos
oscilantes em qualidade como “O Predador 2” e “A Sombra e A Escuridão”) foi
corajoso ao moldar, neste celebrado filme televisivo, uma estrutura à qual
todos os filmes de caráter biográfico deveriam se basear: Um registro
absolutamente imparcial em seu humor e seu drama, mostrando todas as facetas
questionáveis de caráter que seu biografado porventura poderia ter, e muitas
vezes, beneficiando-se delas para incrementar e tornar ainda mais envolvente
sua narrativa.
Filmes superestimados como “A Teoria de Tudo”
poderiam aprender a ser muito melhores, se sua execução se inspirasse na deste
daqui.
Peter Sellers (vivido com preciosismo ímpar por
Geoffrey Rush), famoso ator e comediante nascido na Inglaterra foi criado por uma
mãe rígida, ainda que com ternura esmagadora, e por seu pacato e submisso pai.
Durante a juventude, descobriu um insuspeito gosto pela atuação, valendo-se
desse dom para, mais tarde, no final da década de 1950, se tornar radialista e
então ator. Logo, ele sinalizou também, em sua inspirada inclinação para o
improviso e na rica capacidade para caracterizações de natureza caricata, uma
habilidade nata para comédia. Tendo abertas as portas para o estrelato no
cinema, Sellers, a medida que adquiria cada vez mais reputação, cacife e
privilégios, foi revelando também uma personalidade mimada e egoísta.
O filme enaltece seu talento na mesma proporção
que critica (e ridiculariza) seus desvios imaturos de caráter: Em uma seqüência
é mostrado que, quando trabalhou numa produção com a estrela Sophia Loren
(Sonia Aquino, belíssima), Sellers se apaixonou pela grande atriz italiana e,
não apenas acabou deixando Anne (Emily Watson), sua então esposa, como também
(quando ficou absolutamente claro que Loren não queria nada com ele) teve um caso
com a substituta da atriz.
Ao fim dos anos 1960, sua carreira ganhou fôlego,
ao participar de "A Pantera Cor-de-Rosa", comédia estrelada por David
Niven e dirigida pelo americano Blake Edwards (o ótimo John Lithgow). O sucesso
de seu personagem, o Inspetor Clouseau –no filme inicial, pouco mais que um
coadjuvante –o converteu no protagonista dos filmes seguintes da série.
Anos depois, ele descobriu um novo romance ao
conhecer a bela atriz sueca Britt Ekland (Charlize Theron), contudo seus
ataques de raiva prejudicaram e encerraram também esse casamento. O filme
registra impiedosamente a ironia da trajetória profissional e pessoal de
Sellers, ao mostrar que ele obtém largo sucesso comercial como grande
comediante, ainda que a série “A Pantera Cor-de-Rosa” não lhe fosse
satisfatória como artista, enquanto sua vida particular foi ficando cada vez
mais em frangalhos.
Entre a narração de uma cena e outra, que
abrange estes trechos da vida de Sellers, é curioso notar a intervenção magnífica
do ator Geoffrey Rush, a comentar e refletir tal cena, às vezes, até mesmo
despindo-se do personagem de Peter Sellers e assumindo (com a mesma veemência)
os personagens de outros colegas do elenco, sejam eles homens ou mulheres (!),
um recurso que serve para mostrar não só a versatilidade inquestionável de
Sellers em suas personificações, mas também para evidenciar a excelência do
grande ator que o interpreta.
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