No cinema de Guilhermo Del Toro algumas regras
inerentes aos filmes de terror sofrem uma ligeira alteração –não são, nem de
longe, as aparições sobrenaturais e fantasmagóricas, os agentes do mal, muito
pelo contrário: O mal na concepção insistente de Del Toro é uma patologia que
os seres humanos, os vivos, trazem junto de si.
Não significa, porém, que as aparições em seus
trabalhos não assustem: Como bom aficionado do gênero, Del Toro é hábil em
compor imagens tétricas, propensas a tirar o máximo de pavor gráfico da
morbidez, embora tal elogio caiba mais às categorias de maquiagem e efeitos
visuais de seus filmes do que à sua capacidade na direção e no roteiro.
“A Espinha do Diabo” começa e inicia com breves
considerações de um personagem morto –o mesmo arremate narrativo pelo qual
começa e termina seu mais recente “A Colina Escarlate” –dando uma idéia
bastante clara da visão emotiva que ele tem: São os vivos que detonam o
sofrimento no mundo, e não os mortos.
A Guerra Civil espanhola devasta o mundo ao
redor do pequeno Carlos (Fernando Tielve), de 12 anos, quando este é deixado no
orfanato de Santa Lúcia.
Lá, ele deve lidar com a inevitável hostilidade
das demais crianças e com algo mais: As aparições do fantasma de um menino,
outrora assassinado naquela instituição, desejoso de que seja executada uma
vingança contra quem o matou.
São, portanto, os personagens, bons e
eventualmente maus, engrenagens por meio das quais a narrativa trabalha uma
redenção às avessas –atribuindo certo caráter lúdico a elementos aos quais são
reservadas normalmente as facetas unilateralmente macabras.
A ratificar tal pensamento, recorrente de Del
Toro, suas obras mais poderosamente ilustrativas vêem a ser as duas produções
que compõem uma ainda inacabada “Trilogia da Guerra Civil” –que, além deste
filme, conta também com o aclamado “Labirinto do Fauno”.
Em comum, além da
ambientação histórica, os dois trabalhos mostram crianças às voltas com a
tragédia, com a orfandade (iminente ou consumada) e com elementos fantásticos
que, se em princípio, parecem ser o manancial de seu temor, logo, se revelam
recursos inesperados na tentativa de se desvencilhar do perigo de fato: O mundo
adulto que insistirá em tragá-los.
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