sábado, 15 de julho de 2017

Solaris

A junção inesperada dos talentos de James Cameron (produtor) e Steven Sodenberg (diretor) rendeu um projeto, também ele, de natureza inesperada: Uma refilmagem norte-americana do fenomenal “Solaris”, de Andrei Tarkoski.
Para além do atrevimento em tentar recriar uma obra de tal magnitude, o filme de Sodenbergh se baseava, com algum bom senso, no mesmo romance de Stanislaw Lem que deu origem ao filme de Tarkovski; este novo filme é, portanto, realizado a partir da inspiração de Tarkovski e não do prestigiado filme que ele fez.
O americano Chris Kelvin (George Clooney, ator predileto de Sodenberg) é um psiquiatra às voltas com seus próprios problemas emocionais: Sua viuvez é recente, e as lembranças de Rheya (Natascha McElhone, de “O Show de Truman” e da série “Californication”), outrora sua esposa são ainda tão recentes quanto dolorosas –essas questões serão revistas mais tarde.
Ao contrário do reflexivo protagonista do outro filme, imerso nos questionamentos intelectuais de sua reclusão no campo, vista no início, o personagem de Clooney surge, nas cenas iniciais, desgastado por uma rotina urbana que ele parece enxergar como um remédio para sua angústia.
Há um tom ligeiramente formulaico no modo com que Sodenberg expõe essa condição.
Logo em seguida, Chris é chamado a uma estação orbital ao redor do desconhecido planeta Solaris.
Os tripulantes dessa estação sofrem males desconhecidos que levaram alguns deles ao suicídio ou ao desaparecimento –e a presença de Kelvin é requisitada por um dos tripulantes, Gibarian, afirmando ser ele o mais indicado para avaliar a situação.
Desde o início supõe-se que tudo seja provocado pela proximidade do estranho planeta. Ao chegar lá, Kelvin procura em vão por algumas respostas, que apenas se desdobram em mais e mais perguntas: Qual a razão do comportamento irrequieto e evasivo de um dos astronautas (vivido pelo já naturalmente irrequieto e evasivo Jeremy Davies, de “O Resgate do SoldadoRyan")? O que aconteceu com Gibarian (Ulrich Tukur) que, Kelvin descobriu ao chegar, terminou se suicidando? Por que a astronauta aparentemente mais lúcida do grupo, Gordon (a grande Viola Davis, muito antes da fama), é assolada por uma expressão de angústia constante?
À noite, enquanto ainda tenta absorver o estranho comportamento dos tripulantes, Kelvin se dá conta de que o lugar em que estão pode materializar o impossível: Rheya, sua esposa falecida aparece à sua frente, em carne e osso (!), oferecendo ao alarmado Kelvin a chance de remodelar o passado ou de viver sua aflição toda outra vez.
A descoberta de algo que contradiz as bases da realidade se torna assim o questionamento dos personagens –afinal, é a realidade a referência pela qual a ciência dos homens pensantes encontra uma âncora para jamais naufragar na loucura.
Todavia, apesar da suposta densidade imposta pela narrativa deliberadamente lenta e contemplativa, o filme de Sodenberg não adentra essas dúvidas de maneira tão fascinante e circunspecta quanto o filme de Tarkovski: Prefere os elementos mais prosaicos, o drama romântico que ronda os personagens de Clooney e Natascha, o senso de aventura sugerido (jamais, porém, explorado) nos portentosos efeitos visuais –empregados, contudo, de forma bastante discreta –e o suspense que parece brotar do mistério espacial; Qual é, afinal, a maldição que se abate sobre a nave?
O filme de Tarkovski abraçava isso tudo, e ainda se lançava em imponderáveis possibilidades de reflexão, fazendo tudo isso parecer fácil e simples; o grande mérito do filme de Sodenberg é mostrar, acima de tudo, que não, a realização estupenda de Tarkovski não tinha nada de simples.

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