quarta-feira, 26 de julho de 2017

Tentação Proibida

Não há como negar a ironia de ver uma ainda jovem (e linda!) Nastassja Kinski no papel de uma mocinha envolvida num romance com grandes chances de ser uma relação incestuosa –sendo que o homem mais velho por quem está atraída pode ser seu pai. A ironia vem do fato de que muito se falou, durante algum tempo, de que ela poderia ter um caso com seu próprio pai, o também ator Klaus Kisnki –e o próprio Klaus chegou a incitar tais rumores!
Há também certa relevância neste trabalho do diretor Alberto Lattuada, no fato de que, ao assumir um tema tão tabu e transgressivo, ele também incorpora uma insuspeita serenidade ao trabalhar tudo isso com delicadeza e graça.
Marcello Mastroianni é Giulio, um arquiteto de meia-idade que vive em Roma, onde tem de aturar os humores da esposa e da filha. Por obrigação de um trabalho, ele vai para Florença onde viveu boa parte da sua juventude antes de partir e, de imediato, cruza-se com uma aparição: Francesca, a personagem inebriante e irresistível de Nastassja!
Nitidamente atraído por ela, ele descobre através de um amigo que Francesca é a filha de Fosca, uma grande paixão que Giulio deixou a exatos vinte anos atrás: A idade da moça, portanto, bate, deixando a forte possibilidade de que ela seja sua filha!
O arquiteto se vê, então, num impasse: Corresponder a atração cada vez maior que sente por ela e perpetrar um possível ato de incesto, ou deixá-la de lado permitindo que a dúvida determine suas escolhas.
A direção de Lattuada, sem rompantes mais autorais, equilibra com sensibilidade as situações que se constroem a partir dessa premissa, num clima disfuncional e inusitado de romance, muito se valendo da presença acachapante de Nastassja Kinski para potencializar a concepção de um desejo que, por vezes, soterra a razão (ela estava, aqui, em seu primeiro grande filme, e só faria “Tess”, com Roman Polanski, um ano depois), e também da excelente desenvoltura de Mastroianni que acha o tom certo de perplexidade, galhofa e angústia para registrar de maneira envolvente os apuros íntimos vividos por seu personagem. Essas inúmeras sutilezas dramáticas são a grande contribuição de Lattuada para com a narrativa, que depende imensamente dessa perspicácia para funcionar.
Ao fim, como o notável trabalho que é –e fruto, de certa maneira do tempo a que pertence –o filme leva até o fim suas provocações: Incapazes de desfazer a névoa de permanente mistério acerca da possível paternidade de Giulio, Francesca toma uma decisão; ele não é pai dela, e sim o homem por quem se apaixonou. E o filme não se isenta, nos vinte minutos finais, em flagrá-los, em audazes cenas de amor. Parece, portanto, bastante inerente o fato de que “Cosi Come Sei” –o título original –reflete uma mentalidade em voga na época, sobretudo, em meio aos jovens: A do amor livre e pleno, difundido pelos adeptos da contracultura.
O diretor Alberto Lattuada aproveitou esse mote para rir de alguns questionamentos de ordem até clerical que convergem no tabu que ele trabalha em seu filme, embevecendo-o com uma saudável dose de libertinagem européia.
Bem administrados, esses ousados elementos rendem um filme delicioso.

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