terça-feira, 5 de setembro de 2017

Armas Na Mesa

Jessica Chastain é um absurdo. A cada filme, ela se mostra uma atriz mais hábil e capaz, bela e talentosa. Havia tudo para que ela se sentisse mesmo à vontade em “Armas Na Mesa” onde ela torna a colaborar –desta vez, como protagonista –com o diretor John Madden (de “Shakespeare Apaixonado”) depois de roubar a cena em “A Grande Mentira”.
Ela é Madeline Sloane, uma lobista tida como uma das grandes profissionais de sua área. E a presença intimidante de Jessica em cena, sua verborragia astuta em atividade constante logo tratam de convencer o público disso.
Trabalhando para uma empresa cujo cliente é um dos barões armamentistas dos EUA –e, para o qual, com efeito, a lei de desarmamento em votação na bancada do congresso americano deve ser derrubada –ela muda subitamente de lado, passando a trabalhar para um grupo pró-desarmamento, liderado por Rodolfo Schmidt (Mark Strong, sempre digno e sólido) que luta por leis mais rígidas de porte de armas.
A justificativa parecem ser os seus princípios.
Mas, como descobrirá o público e muitos dos personagens a orbitá-la, princípios são o que menos pesa na balança moral de Sloane: Tudo o que importa a ela é vencer, e tal vitória justifica a torção eventual da ética numa série de lances ardilosos que beiram a desonestidade e a manipulação.
“O segredo para vencer é nunca deixar que seus inimigos o surpreendam, e sempre surpreendê-los” diz ela, já no contundente monólogo que abre o filme.
É verdade: Ao longo das pouco mais de duas horas de filme serão freqüentes os momentos em que os artifícios de Sloane pegarão de surpresa não apenas seus inimigos, mas também seus aliados e o expectador. Quando uma máscara parece cair, prestes a revelar enfim uma faceta de derrotada, descobrimos que foi mais um estratagema elaborado por ela.
Quando os adversários políticos passam a mover uma série de ataques profissionais e pessoais a ela como forma de desacreditá-la, somos freqüentemente pegos de surpresa pela forma quase desumana (e, não raro, surpreendente) com que ela subtrai os problemas e os neutraliza.
Em algum momento, contudo, Sloane irá rever os limites (ou a falta deles) que ela própria estipulou na busca por seus objetivos.
Muito do filme depende realmente de Jessica Chastain; ela consegue fazer o público se importar com essa protagonista mesmo que ela paulatinamente forneça motivos para desprezá-la, mesmo que sequer haja uma preocupação em dar-lhe um backup emocional que atrele suas motivações ao esforço que despende contra os adversários (aliás, o grande calcanhar de Aquiles da obra), mesmo que muito pouco fiquemos sabendo quem essa mulher é de fato, e mesmo que ela esteja enfrentando pessoas tão frias e calculistas quanto ela própria.
“Armas Na Mesa” também se beneficia do meticuloso roteiro do estreante Jonathan Perera, que parece ávido em mesclar a loquacidade estrutural nos diálogos de Aaron Sorkin (roteirista de “A RedeSocial”) com o turbilhão informativo –e, para alguns, inacessível –de Adam McKay no sensacional “A Grande Aposta”, ainda que em sua pouca experiência, ele não obtenha o equilíbrio primoroso de nenhum desses dois casos.
O diretor Madden, visivelmente apaixonado pelos meandros narrativos desse tipo de produção –que agrega as aspirações de um drama contemporâneo, um charme de filme de espionagem moderno e, mais ao fim, as evoluções sintomáticas de um filme de tribunal –evidencia essas duas grandes qualidades (uma atriz magnífica e um roteiro amplo e detalhado) reconhecendo neles os verdadeiros diferenciais deste trabalho.

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