sexta-feira, 27 de outubro de 2017

A Rainha

Há um certo espaçamento temporal através do qual o cinema (ou mais precisamente seus realizadores) adquire autonomia emocional (e, por que não, moral) para lidar com determinados acontecimentos históricos e melhor vislumbrar os desdobramentos que os anteciparam e os sucederam. Aconteceu, por exemplo, com o 11 de Setembro, cujas primeiras obras cinematográficas a abordá-lo surgiram em 2006, com “Vôo United 93”, de Paul Greenglass, e “As Torres Gêmeas”, de Oliver Stone.
No mesmo ano, foi lançado também um filme que fazia uma espécie de expiação da parte do cinema britânico acerca da morte da Princesa Diana, ocorrida num acidente em 1997.
Abstendo-se a abordar os detalhes do acidente em si (isso a mídia fez bastante) ou do período turbulento que a vida de Diana passava na época (isso, por sua vez, quem fez foi a irregular produção “Diana”, de 2014, estrelada por Naomi Watts), o filme dirigido com economia emocional até excessiva por Stephen Frears observa as conseqüências mais íntimas acarretadas pela tragédia no seio da família real, e na maneira curiosa com que a sociedade inglesa reagiu à morte da “princesa do povo” e ao aparente descaso com que tentaram tratar o fato.
O roteiro árido e objetivo de Peter Morgan opta como ponto de partida, a Rainha Elizabeth e o início de sua conflituosa relação com o Primeiro Ministro eleito Tony Blair.
Será o próprio Tony Blair quem precisará, um pouco mais tarde, apelar de certa forma ao bom senso da monarca quando começar a ficar óbvia a indignação popular crescente, em meio à comoção mundial causada pela morte da Princesa Diana num acidente automobilístico, relacionada à tentativa da família real em não expressar qualquer manifestação de pesar. O quê, ele percebe, leva o povo inglês à uma inédita tentativa de questionar a própria monarquia.
O trabalho de Frears, assim, lança um sutil olhar sobre as delicadas questões familiares que pesaram naquele momento, justapostas à uma diferenciada reação coletiva. A monarquia vista de dentro em uma perspectiva familiar de sua obrigação para com os anseios (ainda que existenciais) de seu povo.
Vencedora do Oscar de Melhor Atriz, Helen Mirren, como Elizabeth, paira pelo filme com sua magnífica presença muito bem coadjuvada pelo excelente Michael Sheen (no papel de Tony Blair). O filme só encontra certo problema no estilo excessivamente britânico, comedido e distanciado, com que o diretor Stephen Frears aborda o tema, levando este trabalho no que parece ser uma deliberada isenção de empatia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário