quarta-feira, 17 de janeiro de 2018

A Dama Na Água

Mais cedo ou mais tarde, uma carreira construída em torno de alguma espécie de fórmula passa por uma necessidade de reinvenção.
E o diretor M. Night Shyamalan (que havia conquistado grande aceitação de público e crítica com seus filmes que nada mais eram que ótimas e espertas variações cinematográficas e de pretensões artísticas para contos fantásticos, ora mirabolantes, ora aterrorizantes) certamente percebeu isso, dando início a um projeto de natureza mais insólita, ligeiramente afastado das suas obras anteriores.
Diferente de “O Sexto Sentido”, “Sinais” e “A Vila”, “A Dama Na Água” não era pautado pelos sustos, e ao contrário de “Corpo Fechado” não caminhava com sua premissa fantástica em direção ao realismo –ele seguia em caminho oposto.
“A Dama Na Água” era, de uma maneira um pouco torta, um conto de fadas.
Shymalan preservou seu estilo de roteirizar e dirigir –que, neste filme, começava a deixar transparecer uma presunção e uma soberba que prejudicaram o resultado –no entanto, mudou radicalmente o conceito com o qual trabalhava.
A história de Cleveland Heep (Paul Giamatti), um desiludido e solitário zelador de condomínio, e dos personagens que o cercam, carrega em tintas de estranheza que na maioria esmagadora de sua duração soam inapropriadas.
Cleveland encontra, em certa noite, uma jovem despida e assustada (Bryce Dallas Howard, de “A Vila”) que parece ter saído da própria piscina do local (!). A jovem é arredia, inicialmente não parece conseguir se comunicar e nem sequer pertencer ao mundo normal. Ele descobre aos poucos que ela é uma "ninph", um ser mitológico que inspira as pessoas (saído inteiramente da imaginação de Shyamalan), e está ali se escondendo de seu predador natural, uma espécie de lobo monstruoso.
Segundo a própria lenda que a cerca, há pessoas específicas, com habilidades específicas que serão de fundamental importância no ritual para levá-la para casa.
Tentando assim juntar forças para sair da depressão na qual seu passado trágico o colocou, Cleveland toma para si a missão de encontrar tais pessoas.
Para grande parte do público, o maior problema de “A Dama Na Água” era que ele não trazia os sustos freqüentes e os sobressaltos ocasionais e bem elaborados com os quais Shyamalan havia acostumado a platéia em seus últimos filmes. Embora até tivesse alguma tensão, “A Dama Na Água” trabalhava tais elementos, no máximo, com uma displicência quase existencial: Exemplo disso é a cena em que o monstro encurrala num beco escuro um crítico de cinema (um dos vários personagens apáticos do filme) e ele começa a discorrer sobre os elementos genéricos de uma seqüência assim, numa brincadeira pretensiosa e anti-climática de metalinguagem.

Mas, é provável que o maior problema deste filme de Shyamalan realmente tenha sido o fato dele criar uma mitologia própria para esse conto de fadas –o de uma “ninph”, algo como uma sereia bípede (!), que precisa atrair uma águia gigante que a levará para o mar (!) a salvo de um lobo composto por grama (!!) –carregando a premissa de elementos contraditórios (como se pode notar...) que, no fim das contas, não compunham uma trama que instigasse ou fascinasse o público: As criaturas inventadas por ele (desde a protagonista aos seres que surgem com expectativa zero no suposto clímax) não despertam qualquer interesse ou empatia no expectador, e os detalhes que as cercam oscilam entre o banal e o tedioso.

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