terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Poderosa Afrodite

Num de seus inúmeros títulos quase a beira do esquecimento lançado nos anos 1990, o diretor Woody Allen realiza uma elegia às tragédias gregas pontuadas por ironias do destino –e por isso, introduz na narrativa um engraçado coro de narradores da Grécia antiga liderados por F. Murray Abrahams –embora, no fim das contas, esta seja apenas mais uma de suas habituais e habilidosas comédias cheias de gracejos e galhofas.
Nela, Lenny (vivido pelo próprio Allen) é um nova-iorquino casado com a séria e perdulária Amanda (Helena Bonham Carter) que, num rompante de curiosidade decide um dia que quer conhecer a mãe biológica de seu filhinho adotivo, garotinho extremamente esperto e inteligente. Após sucessivas confusões ele encontra a tal moça, Ash (Mira Sorvino, a grande revelação deste filme) que embora seja atriz pornô e garota de programa, é belíssima e tem um coração de ouro, bem como uma voz das mais esganiçadas! Ele torna-se uma espécie de "amigo" dela, e tenta ajudá-la a melhorar de vida, inclusive tentando fazer com que ela encontre o "homem certo", providenciando encontros que culminam nas ocasionais gafes cômicas do diretor.
Lenny não percebe, nesse processo, que começa a apaixonar-se por Ash.
Se há uma referência plena a ser observada nesta obra menor de Woody Allen, ela diz respeito ao felliniano “As Noite de Cabíria”, e sua protagonista, a prostituta pura de coração, o otimismo em pessoa, vivida por Julietta Massina. Ela é, sem dúvidas, a grande inspiração para a concepção da personagem Ash, cuja atuação cheia de trejeitos estudados e bem aplicados da ótima Mira Sorvino (filha do ator Paul Sorvino) –ganhadora à propósito do Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante –ajuda a tornar uma personagem toda singular e diferenciada na ampla galeria de personagens antológicos já criada por Woody Allen, ainda que o filme ligeiro, engraçado e intelectualizado ao qual ela pertença no entanto seja desprovido dos aspectos geniais que Allen mostrou em seus mais marcantes trabalhos.

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