Diretor de “Três Anúncios Para Um Crime”, um
dos grandes favoritos ao Oscar 2018, Martin McDonagh tem, como se pode
constatar por este trabalho, um apreço pelo humor negro. E como todo autor a
lidar com um estilo que aprecia, ele o exerce com habilidade insuspeita: “Sete
Psicoapatas e Um Shih Tzu” une comédia e sordidez humana num viés de cinismo
que dá sabor à narrativa algo multifacetada que ele oferece.
Seu protagonista numa brincadeira de
metalinguagem que aos poucos vai ficando clara é Marty, um reflexo do próprio
Martin McDonagh, diretor e roteirista (interpretado por Colin Farrel, chapa do
diretor com quem antes fez “Na Mira do Chefe”). Envolvido com a bela e impaciente
Kaya (Abbie Cornish), Marty é um roteirista hesitante –tem uma idéia para um
roteiro que vai pouco além do título –“Seven Psychopaths”, o título original –e
aos poucos vai elaborando os personagens: O 1º é uma mulher que, na cena indicativa
e significativa que abre o filme, extermina a sangue frio dois assassinos de
aluguel; o 2º é um quacre (Harry Dean Stanton), pai desolado de uma garota
morta que persegue o assassino dela mesmo depois que este paga uma sentença de
anos e se regenera após a prisão.
Aos poucos a realidade vai invadindo a premissa
fictícia: O melhor amigo de Marty, o destrambelhado Billy (o ótimo Sam Rockwell
que está no elenco de “Três Anúncios Para Um Crime”) trabalha num negócio ilícito
e picareta com Hans (Christopher Walken); eles ‘sequestram’ cães de pessoas
ricas e os devolvem depois que é anunciada uma recompensa, para assim dividirem
o dinheiro; pois o 3º psicopata é justamente Charlie Costello (Woody Harrelson,
também ele presente em “Três Anúncios...”), o gangster irascível dono do
cachorrinho que a perplexa Sharice (uma breve ponta de Gaborey Sidibe, de
“Preciosa”) perdeu –cachorro este levado pelos ‘seqüestradores’.
O 4º psicopata é um vietnamita que tem por
obsessão vestir-se de padre e chacinar norte-americanos (!) e que terá apenas
um sentido reflexivo no final.
O 5º psicopata, que se apresenta à Marty
respondendo a um anúncio colocado num jornal por Billy, é Zach (o lendário Tom
Waits) e sua namorada Maggie –seria ela então o 6º psicopata –que juntos resolveram
viajar os EUA matando serial killers (deram cabo, inclusive do Zodíaco!), mas
vieram a se separar.
O caldo da trama elaborada por McDonagh
engrossa quando as pontas soltas começam surpreendentemente a se juntar: O
rastro de vingança de Charlie em busca de seu cachorro seqüestrado (da raça
shih tzu) leva a morte da esposa de Hans e, por conta disso, Billy
–revelando-se o 7º psicopata –mata sua namorada Angela (a linda Olga Kurylenko)
que, à propósito, era o 1º psicopata mencionado no início.
À medida que a narrativa se afunila em seus
quarenta minutos finais (que se estendem desnecessariamente), a metaliguagem
proposta pelo diretor se mostra ainda mais intensa e notável, bem como algumas
surpresas que ele guarda na manga e a influência nítida de Tarantino e seu
“Pulp Fiction” –algo inevitável em toda uma geração de cineastas americanos.
“Sete Psicopatas e Um Shih
Tzu” é uma obra de um jovem autor habilidoso e antenado com as características
contumazes do cinema urgente feito na atualidade, tem suas fragilidades, é bem
verdade (e elas respondem, sobretudo, pela sua incapacidade em ser mais
objetivo com seu enredo, resultando numa primeira metade sensacional e numa
segunda enrolada), mas é revelador de um talento que, cedo ou tarde, entregaria
algo realmente extraordinário.
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