sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

Sete Psicopatas e Um Shih Tzu

Diretor de “Três Anúncios Para Um Crime”, um dos grandes favoritos ao Oscar 2018, Martin McDonagh tem, como se pode constatar por este trabalho, um apreço pelo humor negro. E como todo autor a lidar com um estilo que aprecia, ele o exerce com habilidade insuspeita: “Sete Psicoapatas e Um Shih Tzu” une comédia e sordidez humana num viés de cinismo que dá sabor à narrativa algo multifacetada que ele oferece.
Seu protagonista numa brincadeira de metalinguagem que aos poucos vai ficando clara é Marty, um reflexo do próprio Martin McDonagh, diretor e roteirista (interpretado por Colin Farrel, chapa do diretor com quem antes fez “Na Mira do Chefe”). Envolvido com a bela e impaciente Kaya (Abbie Cornish), Marty é um roteirista hesitante –tem uma idéia para um roteiro que vai pouco além do título –“Seven Psychopaths”, o título original –e aos poucos vai elaborando os personagens: O 1º é uma mulher que, na cena indicativa e significativa que abre o filme, extermina a sangue frio dois assassinos de aluguel; o 2º é um quacre (Harry Dean Stanton), pai desolado de uma garota morta que persegue o assassino dela mesmo depois que este paga uma sentença de anos e se regenera após a prisão.
Aos poucos a realidade vai invadindo a premissa fictícia: O melhor amigo de Marty, o destrambelhado Billy (o ótimo Sam Rockwell que está no elenco de “Três Anúncios Para Um Crime”) trabalha num negócio ilícito e picareta com Hans (Christopher Walken); eles ‘sequestram’ cães de pessoas ricas e os devolvem depois que é anunciada uma recompensa, para assim dividirem o dinheiro; pois o 3º psicopata é justamente Charlie Costello (Woody Harrelson, também ele presente em “Três Anúncios...”), o gangster irascível dono do cachorrinho que a perplexa Sharice (uma breve ponta de Gaborey Sidibe, de “Preciosa”) perdeu –cachorro este levado pelos ‘seqüestradores’.
O 4º psicopata é um vietnamita que tem por obsessão vestir-se de padre e chacinar norte-americanos (!) e que terá apenas um sentido reflexivo no final.
O 5º psicopata, que se apresenta à Marty respondendo a um anúncio colocado num jornal por Billy, é Zach (o lendário Tom Waits) e sua namorada Maggie –seria ela então o 6º psicopata –que juntos resolveram viajar os EUA matando serial killers (deram cabo, inclusive do Zodíaco!), mas vieram a se separar.
O caldo da trama elaborada por McDonagh engrossa quando as pontas soltas começam surpreendentemente a se juntar: O rastro de vingança de Charlie em busca de seu cachorro seqüestrado (da raça shih tzu) leva a morte da esposa de Hans e, por conta disso, Billy –revelando-se o 7º psicopata –mata sua namorada Angela (a linda Olga Kurylenko) que, à propósito, era o 1º psicopata mencionado no início.
À medida que a narrativa se afunila em seus quarenta minutos finais (que se estendem desnecessariamente), a metaliguagem proposta pelo diretor se mostra ainda mais intensa e notável, bem como algumas surpresas que ele guarda na manga e a influência nítida de Tarantino e seu “Pulp Fiction” –algo inevitável em toda uma geração de cineastas americanos.
“Sete Psicopatas e Um Shih Tzu” é uma obra de um jovem autor habilidoso e antenado com as características contumazes do cinema urgente feito na atualidade, tem suas fragilidades, é bem verdade (e elas respondem, sobretudo, pela sua incapacidade em ser mais objetivo com seu enredo, resultando numa primeira metade sensacional e numa segunda enrolada), mas é revelador de um talento que, cedo ou tarde, entregaria algo realmente extraordinário.

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