quinta-feira, 1 de março de 2018

Trovão Tropical

O grande problema de Ben Stiller como diretor –função iniciada nos anos 1990, com “Caindo Na Real”, com Winona Ryder –é sua vontade de fazer demais: Ele incrementa tanto a narrativa que lhe poda a objetividade.
Dentre seus trabalhos atrás das câmeras –entre os quais existem alguns títulos consideráveis –o melhor e mais acertado talvez seja “Trovão Tropical”, sobretudo, porque seu humor se constrói sobre uma série de ocorrências inesperadas e genuinamente hilárias.
Com sacadas assim já se inicia o filme. Uma série de trailers falsos parodiam o que já era em si uma paródia, com filmes impraticáveis como “O Rei do Peidaço” (!), uma versão ainda mais esculachada e escatológica de “O Professor Aloprado”, com Eddie Murphy, estrelada pelo personagem de Jack Black (inspirado, segundo consta, no falecido Chris Farley); “O Beco de Satã”, uma sátira de todos os clichês de dramalhões sérios com o exageradamente dedicado ator vivido (brilhantemente) por Robert Downey Jr. e ainda com uma ponta de Tobey Maguire (ao lado de quem Downey Jr. fez “Garotos Incríveis”). Para finalizar, o próprio Ben Stiller aparece como o astro (remetendo à Sylvester Stallone) de uma série interminável, repetitiva e absurda de filmes de ação, “Scorcher”, que já está em sua sexta parte (!).
Mal atingiu seus primeiros quinze minutos e o filme de Stiller já se revela assim demolidor para com os contumazes reflexos involuntários da fútil Hollywood.
Muito mais virá: Todos os astros mostrados nos trailers (e mais o rapper Alpha Chino –que vive injuriado com a confusão da pronúncia de seu nome soar como Al Pacino!) cada um ao seu modo enfrentando um princípio de decadência, sem vêem reunidos num mesmo projeto de filme de guerra –que, de início, já satiriza a cena clássica de “Platoon” –inspirado nas memórias de um ex-combatente do Vietnam (Nick Nolte). Sem conseguir o realismo desejado, o perplexo diretor (vivido por Steve Coogan, de “Philomena”), pressionado pelos engravatados do estúdio –entre os quais, o executivo boca-suja, desprezível e incontrolável vivido magnificamente por um irreconhecível Tom Cruise –decide levar seu elenco para a selva a fim de promover uma experiência real.
Contudo, o diretor morre explodido por uma mina terrestre (!), deixando-os abandonados na selva com armas reais e à mercê de verdadeiros inimigos armados. E os atores, celebridades alienadas e fúteis, julgando tratar-se de um daqueles laboratórios de filmagem que simulam uma realidade, mal se dão conta da encrenca em que se meteram.
O elenco se diverte tanto quando o expectador nesta comédia destruidora sobre as engrenagens do cinema, que debocha de tudo e não perdoa absolutamente nada, nem ninguém: A tiração de sarro implacável vai desde os coadjuvantes (pena que o intratável e engraçadíssimo agente vivido por Matthew McConaughey aparece tão pouco) até os protagonistas que incluem o hilário australiano Kirk Lazarus (e Downey Jr. está realmente ótimo), cuja dedicação à arte da atuação o leva a escurecer a pele –ele que é loiro de olhos azuis! –para interpretar um negro (!) no filme dentro do filme (e sua interpretação para o modo como um negro se porta e fala é o extremo mais inacreditável de estereótipo a que se pode chegar!); Tugg Speedman o astro em busca de reconhecimento de Stiller (vítima de deboche dos colegas por cometer a ‘apelação’ de encarar um papel de retardado mental!); Jeff Portnoy (Jack Black), o ator viciado em heroína que vai passar poucas e boas com sua abstinência na selva; o rapper Alpha Chino (Brandon T. Jackson) que se ressente da atitude agressiva exigida dele devido à sua sensibilidade enrustida; e o figurante Kevin Sandusky (Jay Barruchel), que tenta manter um pouco de austeridade em meio à tanta gente desgovernada.
Como é de hábito, Ben Stiller como diretor é irrequieto e incansável: Ele incrementa cada segmento com referências, observações e detalhes. Seu filme tem citações e piadas desde as primeiras até as últimas cenas, não deixando espaço para o expectador recuperar o fôlego, e nem tampouco (no caso deste filme tão divertido quanto corajoso) para que os produtores de Hollywood, grande alvo de sua chacota, respirem aliviados.

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