No primeiro “Desejo de Matar” (estrelado por
Charles Bronson), já era enfatizada a ironia no fato de um cidadão comum se
voltar contra a bandidagem ao trilhar o árduo caminho da justiça pelas próprias
mãos.
Em “Harry Brown” (cuja Premissa, a rigor, é a
mesma), essa ironia é potencializada e cristalizada em detalhes ainda mais
pertinentes (a vulnerabilidade ainda mais acentuada e significativa do
protagonista, por exemplo) além do sempre bem-vindo acréscimo do
auto-depreciativo humor inglês –embora o filme seja criteriosamente econômico
nesse aspecto.
Veterano combatente, desejoso de tranquilidade
desde que um derrame confinou a esposa numa cama de hospital, o idoso Harry
Brown (Michael Caine, magistral como de hábito) mora numa periferia londrina
povoada pela mais intratável espécie de delinquentes juvenis –e a
caracterização petulante e agressiva desses jovens é radical a ponto de remeter
as raízes incontroláveis do punk rock inglês.
Quando seu melhor amigo (interpretado por David
Bradley, conhecido como o zelador da Saga “Harry Potter”) e sua esposa morrem
com poucos dias de diferença (ele, devido a um brutal ataque de gangues
locais), algo dentro de Harry parece liberar seu implacável instinto
justiceiro: Não obstante as limitações físicas óbvias e aparentes, ele irá
mover uma vingança metódica e irreprimível contra os criminosos de sua
vizinhança.
Ele inicia sua cruzada dando cabo de dois
ameaçadores traficantes da região (um deles interpretado por Sean Harris, vilão
de “Missão Impossível-Nação Secreta”) para então valer-se de seu arsenal –e em
meio à todas as cenas tensas e explosivas que se seguem, o diretor Daniel
Barber não deixa de salientar a fragilidade de seu protagonista.
Paralelo a isso, uma engajada investigadora
(Emily Mortimer) começa a reunir indícios sobre a matança indiscriminada de
bandidos que, a despeito da incredulidade de seus superiores, começam a apontar
para o inocente velhinho sujeito a ataques de enfisema.
Competente e envolvente, curiosamente irônico
para com as expectativas de seu próprio público e bastante notável justamente
por isso, “Harry Brown” tem o mérito não só de ser um dos mais sensacionais e
válidos estudos sobre a justiça com as próprias mãos, como também de colocar no
centro do espetáculo um ator fenomenal do calibre de Michael Caine, normalmente
desperdiçado em participações coadjuvantes.
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