Eis um filme até bastante habilidoso em sua
esquisitice.
Vejamos: Trata-se de uma aventura de ação
pós-apocalíptica envolvendo... dragões (?!?).
Dirigido por Rob Bowman (cujos créditos mais
expressivos remetem a alguns episódios da série “Arquivo X”), “Reino de Fogo”
promove uma miscelânea toda curiosa e desigual, mas sem muita razão de ser no
final das contas, o que corrobora com a evidência de algumas de suas
imperfeições.
Se o personagem Danton Van Zan, que Matthew
McConaughey interpreta com fulgor raivoso, tem a exuberância para chamar para
si o protagonismo, o seu aliado na luta contra os dragões, o inglês Quinn
(Christian Bale, anos antes da ascensão na carreira promovida pelo “Batman” de
Christopher Nolan) segue uma linha mais discreta e introspectiva –ainda assim,
é Quinn o personagem principal de fato; desde o início quando ele, ainda
criança, desperta inadvertidamente um dragão em meio às obras subterrâneas
gerenciadas por sua mãe (e com isso, determina a desolação inapelável na qual a
humanidade viverá dali para frente), até anos depois quando, já adulto, ele se
vê à frente de uma comunidade que aprendeu a se virar escondendo-se o máximo
possível das criaturas cuspidoras de fogo.
A caracterização da rotina desolada da
comunidade de Quinn é impecável: Vivem de cavar obstinadamente para que tenham
no subsolo um refúgio garantido e constante para o perigo dos dragões –tanto
que tal ato está incluído no contexto de suas orações.
“Star Wars” não é mais que uma encenação de
peça infantil –cuja autoria Quinn malandramente reclama para si!
Os dragões queimam tudo que vêem pela frente;
seu alimento, de fato, são as cinzas de tudo que seu fogo destrói. Um dia –reza
a narração em off do próprio Christian Bale –não haverá mais comida, tendo eles
destruído tudo, e eles se extinguirão recorrendo ao canibalismo; é isso,
supõe-se, que ocorreu aos dinossauros cuja extinção, Quinn afirma, é culpa
deles.
Nesse cenário de desesperança (reforçado pela
fotografia de Adrian Biddle que carrega nos tons de prata e cinza, assim como
na luz difusa), surge o americano Van Zan e seu grupo de assim auto-intitulados
‘caçadores de dragões’ –tão ameaçadoras são as feras, porém, que a alcunha soa
despropositada aos ouvidos de Quinn e de seu braço-direito Creedy (Gerard
Butler, também ele, anos antes da fama por “300”).
Van Zan e sua arrogância tipicamente americana
–temperada com uma amargura intensa –traz algum otimismo à comunidade,
sobretudo, depois que seu grupo (numa cena arrojada) consegue matar um dragão.
A promessa do princípio de uma calejada supremacia
da raça humana sobre as criaturas cuspidoras de fogo, no entanto, se revela
fugaz quando Van Zan e sua postura começam a fazer mais mal do que bem: Ele
entra em atrito com a liderança protecionista e isolacionista de Quinn quando
resolve levar homens (mesmo os não-voluntários) à Londres, onde acredita,
encontrará o único dragão macho da espécie –aquele mesmo que Quinn vislumbrou
quando criança –cuja morte pode colocar um fim permanente à infestação de
monstros.
Gradativamente, “Reino de Fogo” vai se afastando
de sua inclinação para “Mad Max” ao imolar aspectos de filmes mitológicos de
capa & espada (nos quais a aparição de dragões é, de fato, mais comum) com
sua ambientação apropriadamente europeia lançando mão de castelos úmidos de
tijolos e outras evocações típicas.
Causa uma impressão estranha, visto que nunca
abandona também seus elementos de ficção científica. O trabalho de Rob Bowman
parece se esbaldar com a originalidade embutida na premissa, e dele extrai
vigor e euforia o suficiente para entreter do início ao fim.
Seu pecado é a incongruência: Seus
protagonistas (a despeito do empenho verdadeiramente admirável de Bale e
McConaughey) não têm carisma o bastante. Suas sequências (ainda que bem
executadas) não se destacam de fato. E sua postura de gênero não fica clara em
momento algum justamente por conta de sua singularidade.
É bom, mas podia ser sensacional.
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