sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Machete Kills


Na continuação de seu trailer-falso tornado um longa-metragem real –derivado, por sua vez, do projeto “Grindhouse” –Robert Rodriguez incrementou ainda mais a mescla de referências, influências e tendências que caracterizava o primeiro “Machete” e dele fazia quase um Tour de Force narrativo: A iniciar esta quase experiência de imersão em tudo o que o cinema-poeira setentista tinha de mais desavergonhado e popularesco, temos (veja só!) mais um trailer falso –antecedido por aquelas vinhetas retrô que tanto Rodriguez quanto Quentin Tarantino adoram colocar em seus filmes –de uma produção intitulada “Machete Kills Again... In The Space” (!).
O filme propriamente dito começa logo depois: Na esteira do final de sua aventura anterior, onde vemos o vingador Machete Cortez (Danny Trejo, mais casca-grossa do que nunca) pegar a estrada ao lado de sua agora parceira Sartana (Jessica Alba), testemunhamos uma ação do próprio Machete ao lado dela tentando desbaratar um cartel munido de armas fornecidas pelos militares –o bandidinho da vez que surge nesse prólogo é interpretado por Freddy Rodrigues, de “Garotas Sem Rumo”, que o próprio Robert Rodriguez (nenhum parentesco) dirigiu em “Planeta Terror”.
Após perder a mulher que ama nessa sequência, Machete, sedento de vingança é despachado numa missão de suma importância pelo presidente dos EUA em pessoa, vivido por Charlie Sheen (que aqui adota seu nome real, Carlos Estevez!), na qual deve encontrar o poderoso líder do cartel, Marcos Mendez (Demian Bichir) e, conforme a circunstância, mata-lo.
Seu contato na tumultuada fronteira EUA/México –e que, nessa tresloucada realidade alternativa concebida por Rodriguez, inclui uma muralha megalomaníaca a separar os países –vem a ser deliciosa e insinuante Miss San Antonio (Amber Heard) cujo disfarce de ganhadora de sucessivos concursos de beleza só reforça o colorido vibrante e esfuziante com o qual o diretor caracteriza seu filme.
E a jornada de Machete segue assim na construção de uma aventura descerebrada, evocativa do cinema mirabolante que suscita, fazendo de seu protagonista uma versão latina, sangrenta e truculenta de James Bond transfigurada por todos os vícios que acompanham seu contexto: Eis que Mendez, o tal vilão, tem lá um plano mirabolante –os batimentos de seu coração estão conectados à um míssil que será disparado contra o solo americano (!). Para desarmar tal engenhoca, Machete, portanto, precisa mantê-lo vivo e atravessar com ele a fronteira. Contudo, a cabeça de Machete está a preço de ouro e isso atrai a atenção de pelo menos um oponente ameaçador: O lendário assassino de aluguel Camaleão –que, honrando o nome, se metamorfoseia em nada menos do que quatro intérpretes ao longo do filme, entre eles, Walton Goggins, Cuba Gooding Jr. e Lady Gaga (participações espetaculares que só um diretor de natureza descolada e cult como Rodriguez é capaz de atrair).
E “Machete Kills” não se acomoda nessa premissa: Quando achamos que as peças do tabuleiro estão estabelecidas, eis que o verdadeiro vilão do filme se revela; o ardiloso Luthor Voz, incorporado por Mel Gibson –e não deixa de ser uma tremenda e brilhante inversão de valores proporcionada por Rodriguez o fato de que, neste e no primeiro filme, o calejado Danny Trejo (sempre relegado à papéis coadjuvantes ou de vilões devido à sua compleição física) tem a chance de ser protagonista tendo como vilões dois dos mais celebrados astros de ação do passado; o próprio Gibson e Steve Segal (no filme anterior).
Após uma série de perseguições, tiroteios e batalhas onde as implausibilidades se equilibram à moda das obras que o diretor quer homenagear, eis que a história culmina num gancho desavergonhado para um próximo filme –e que, então descobrimos, acaba sendo justamente o filme mostrado no trailer do começo: “Machete Kills Again... In The Space” (cujo título já diz tudo) é, pois, a continuação de “Machete Kills” que, no senso de humor referencial e sarcástico de Rodriguez, pode acabar nem sendo feito (a repercussão deste filme foi bem menor que a do primeiro), tornando-se assim o que era para ser desde o começo, um trailer falso.

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