Fenômeno intrigante e complexo de ser explicado
no fim dos anos 1990, “A Bruxa de Blair” teve, acima de tudo, um senso desigual
de oportunidade ao beneficiar-se de uma quase involuntária campanha de
divulgação online onde valia-se de uma internet ainda engatinhando em termos de
aplicação das ferramentos virtuais e noção prática de sua extensão.
Observado completamente fora de seu contexto, o
filme independente dirigido por Eduardo Sanchez e Daniel Merrick que assistimos
é algo básico, simplista e até mesmo excessivamente elíptico.
Trata-se do conteúdo alegadamente pertencente à
uma câmera que estaria sendo operada por três jovens documentaristas que, um
ano antes, haviam se perdido nas imediações da floresta de Burkitsville.
Entretanto, a experiência de “A Bruxa de Blair”
não se resume apenas a isso –não se você deseja compreender e assimilar por
inteiro toda a comoção que, em sua época, ele gerou entre os fãs de filmes de
terror.
Entre outras coisas –como o boca-a-boca
poderoso que se difundiu pelo público –o site oficial do filme (algo inédito
até então) oferecia um quadro cronológico muito mais complexo e elaborado da
história da bruxa Ellie Sedward; da qual o filme era apenas a ponta do iceberg.
Descobríamos sobre a maldição da bruxa –que
remete deste os tempos do Século XVIII –na cidade então conhecida como Blair, e
de como acontecimentos macabros (registrados em tom documental ao longo das
décadas) levaram ao abandono dessa cidade e ao surgimento da cidade (real) de
Burkitsville no mesmo lugar; o que fez com que ela e sua população herdassem o
infortúnio da maldição da bruxa.
Esses registros documentais culminam, todos, na
alarmante reportagem sobre os três jovens cinegrafistas que, ao tentar filmar
um documentário sobre a lenda local, resolveram entrar na floresta, e nunca
mais foram vistos.
A grande maioria dessas informações não se
encontra no filme.
O filme é –segundo os créditos iniciais, em tom
de seriedade sensacionalista –uma versão editada e comercializada do material
encontrado um ano após o desaparecimento deles.
Assim, embarcando nessa revisão devidamente
contextualizado e aclimatado à proposta um tanto incomum dos seus realizadores,
o expectador testemunha as filmagens em inicial tom de inocência perpetrada por
Heather Donahue, Josh Leonard e Michael Williams (atores que utilizaram seus
nomes reais para batizar seus personagens).
Segue-se um filme que lembra mais um making-of
a medida que os jovens se dedicam à captação de depoimentos que vão englobando,
aos poucos, a aflição genuína que a lenda local desperta nos cidadãos comuns.
Aos poucos, essa aflição contagia os protagonistas e, por fim, o expectador.
Logo, vemos a ida em direção à floresta, e os
dias terríveis que se seguem quando eles se descobrem perdidos, e, quem sabe,
espreitados por algo que não entendem e não compreendem.
Toda essa narrativa unilateral –baseada
exclusivamente no que as câmeras ligadas capturam, o quê passou a ser chamado
de ‘found footage’ –conduz aos aterradores quinze minutos finais que, sem
mostrar coisa alguma, estão entre as sequências mais memoráveis do gênero de
terror.
Outro fator –à época muito mais eficaz do que
hoje –que ampliou exponencialmente o efeito de “A Bruxa de Blair” no público (e
que, de novo, responde por um senso de oportunidade muito afiado) é o fato de
que grande parte do público que o prestigiou e que com ele se impressionou,
julgava que tudo o que ocorria na tela era real, ou tinha uma chance
considerável de ser real: Lembre-se, naquela época, a pesquisa na internet não
era tão comum, eficiente e imediatamente esclarecedora como é hoje!
Comparado erroneamente, em sua escolha de
estilo com o famigerado “Holocausto Canibal”, um falso documentário italiano
dos anos 1970, “A Bruxa de Blair” abriu as portas para uma nova forma de se
fazer, e mais do que isso, de se promover cinema; depois dele, muitas outras
obras, a maioria de terror, passaram a usar do recurso cada vez mais defasado
do ‘founf footage’, e até mesmo superproduções do cinemão hollywoodiano
passaram a empregar a internet como ferramenta de divulgação.
É certo concluir, porém,
que nenhum outro filme, nesse sentido, amedrontou o público em sua inocência
como este conseguiu fazê-lo.
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