A obra tremendamente controversa do diretor
alemão Tom Six tem por objetivo provocar o público; mas, ela o faz por meio de
percepções experimentais que não admitem concessões. A única maneira de
apreciá-lo (se é que existe como fazê-lo) é abraçando por inteiro seus
propósitos ultrajantes; assim como a única reação plausível ao seu espetáculo
de horrores é a aversão completa de seu resultado final.
“A Centopéia Humana” obedece parâmetros e
estruturas de roteiro muito parecidos com filmes usuais de terror: Temos um
arremedo de cientista maluco, na figura de um cirurgião médico outrora
especializado em siameses (Dieter Laser) cuja intenção é fazer uma experiência
que desafia os limites da ética e do bom senso.
Ele acredita poder criar uma centopéia gigante
a partir de cobaias humanas, costurando em fila a boca de um ao ânus de outro
(!). Para tal deturpação, ele sonda turistas desavisados. São três que vêem
parar em suas garras, um japonês (Akihiro Kitamura) e duas garotas americanas
(Ashlynn Yennie e Ashley C. Williams).
Nesse percurso, o filme adquire similaridades
com muitas obras já bastante aflitivas sobre reféns nas mãos de sádicos
psicopatas, como “Jogos Mortais”, “O Albergue” e outros títulos.
E esse registro do terror usual não omite nem mesmo
seus lapsos: O filme de Six parece deliberadamente mostrar-se rudimentar,
grosseiro, convencional e previsível –evocando, intencionalmente ou não, todas
as características mais óbvias e maçantes do filme de terror moderno.
É quando o esquisito médico põe em prática sua
experiência que as coisas ganham outra dimensão –e o filme de Tom Six passa a
chocar o expectador de verdade!
Após flertar com o que o gênero tem de óbvio, o
diretor Six muda radicalmente sua proposta, e investiga os horrores impronunciáveis
de quando o vilão tem seus anseios plenamente realizados: Os três turistas são
submetidos à cirurgia. Têm seus orifícios emendados. Os joelhos têm seus
tendões cortados para que só consigam andar gatinhando. E, a medida que a
experiência vai se materializando, o diretor nos força a contemplar a
repugnância extrema de ver a centopéia humana vivendo, enquanto seu criador,
num complexo extasiado de deus, se regozija com o medonho resultado.
Talvez, o mais
impressionante de tudo isso é que, não obstante os sentimentos de repulsa,
desconforto e até mesmo indignação que “A Centopéia Humana” provoca, este
primeiro filme ainda se revela modesto e contido na comparação com sua
traumática e desconcertante continuação, onde o diretor Tom Six eleva ainda
mais os níveis de perversidade, bizarrice e degradação humana.
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