sexta-feira, 20 de março de 2020

Inferno Sem Saída

Em 1978, quando as grandes obras cinematográficas a abordarem o conflito no Vietnam ainda estavam por serem feitas, o diretor Ted Post (de “A Marca da Forca”, “Magnum 44” e outros filmes com Clint Eastwood) saiu-se com este libelo eletrizante sobre a natureza da guerra e as estranhas ironias que se repetem em todas as batalhas como estrofes numa poesia macabra, amparando seu trabalho muito vagamente num caso real.
No início da década de 1960, a Guerra do Vietnam ainda não era exatamente uma realidade para os EUA: Após a fracassada incursão das tropas francesas nessas colônias, dez anos antes, o Vietnam do Norte declarou guerra ao Vietnam do Sul. A função do exército norte-americano por lá, até então, tinha mera função de consultoria militar –para tanto, apenas patentes graduadas estavam em atividade no país; seus subordinados se resumiam às truculentas tropas vietnamitas que se opunham aos vietcongues.
Um desses consultores é o Major Asa Baker (Burt Lancaster), oficial cujo comportamento desregrado interrompeu suas promoções estagnando-o naquela patente –e que assim amarga o comando de um entreposto no meio da selva.
Numa leva de oficiais recém-chegados, o Major Baker recebe em seu destacamento o ansioso e afoito Tenente Hamilton (Joe Unger, de “Matador de Aluguel” e “Fuga de Nova York”), o calejado e austero Sargento Oleonowski (Jonathan Goldsmith, de “Mamma Mia-Lá Vamos Nós de Novo”) e o idealista Cabo Courcey (Craig Wasson, astro de “Dublê de Corpo”).
Os três acabam enviados pelo Maj. Baker como oficiais para um posto avançado em Muc Wa, o qual Baker acreditar ser um fim de mundo incapaz de despertar interesse dos inimigos.
Contudo, relatórios de inteligência e ocorrências simultâneas dizem o contrário: Indicam que mais e mais vietcongues estão se somando para atacar sistematicamente Muc Wa.
Em princípio o Tnt. Hamilton –cuja liderança já era frouxa e irresponsável –termina morto por uma série de decisões equivocadas em meio a um ataque. Líder de fato do local, o Sgt. Oleonowski sofre um colapso pouco depois e se suicida.
Com apenas o Cabo Courcey administrando a situação cada vez mais caótica, o Maj. Baker começa a observar na situação de Muc Wa em particular, e em todo o Vietnam do Sul em geral, semelhanças muito grandes entre os apuros de seus militares e os experimentados pelos franceses antes deles, além de um paralelo vislumbrado pela narrativa entre a resistência em Muc Wa e a Batalha das Termópilas (retratada, à propósito, no filme “300”), como atesta seu título original, “Go Tell The Spartans”.
Com um embasamento histórico que pode passar despercebido aos expectadores acostumados a ver o aspecto bélico e unilateral dos filmes sobre a Guerra do Vietnam, o filme de Ted Post joga luz sobre as engrenagens de natureza política que deflagaram a guerra como ela passou a ser conhecida,  expondo as circunstâncias que foram se construindo debaixo dos narizes dos militares perplexos cuja vasta experiência em batalhas pregressas não serviu de nada na hora de preveni-los contra a logística e o absurdo daquela batalha que então se aproximava –e que sabemos, cobrou um alto preço ao subconsciente coletivo norte-americano.
É um filme anti-militarista, como o são praticamente todos que abordaram a Guerra do Vietnam. Seu diferencial está na construção surpreendentemente eficaz e bem executada de todo o suspense em torno do cerco de Muc Wa, de como os militares americanos foram conduzidos pelas circunstâncias à decisões catastróficas e de como, em perspectiva, tudo isso levou a uma insanidade histórica.

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