Em 1977, o quarteto conhecido como “Os
Trapalhões” ainda não estava formado, daí o fato de vermos, neste filme, apenas
três deles: Didi, Dedé e Mussum.
Além disso, o hábito contumaz deles
interpretarem personagens que levavam sempre esses mesmos nomes ainda não
aparecia aqui; em vez disso, o que vemos são os humoristas fazendo um mínimo
esforço onde vivem diferentes personagens. Didi, ou Renato Aragão, é Pilo, Dedé
Santana é Duka, enquanto que Mussum é Fumaça –também eles não interpretam os
mesmos malandros medrosos de praxe; há relativa valentia que os três demonstram
numa ou noutra ocasião. Prova de que, neste exemplar, a fórmula de tipos e circunstâncias
nos papéis que os tornariam famosos ainda estava em criação.
Certamente, ao lado do diretor J.B. Tanko,
muito disso começou a ser elaborado aqui, sobretudo, no que diz respeito à
sinergia cômica entre Aragão e seus companheiros (os filmes anteriores mostram,
quando muito, Didi trilhando meios de brilhar sozinho).
Grande entusiasta de filmagens em locação e, se
possível, capturando em filme a autenticidade das pessoas reais –predisposições
herdadas da Europa, de onde migrou –Tanko coloca seus ‘trapalhões’, na primeira
cena, no meio do povaréu de uma feira livre, esbaldando-se numa espécie de caos
genuíno que registra.
Numa briga –encenada até com considerável
violência –Didi e Dedé, ou melhor, Pilo e Duka se pegam aos socos. Logo, porém,
notamos que é tudo dissimulado: Fumaça, em meio aos afoitos expectadores da
luta, começa a fazer apostas em dinheiro. Quando o valor se torna favorável
para um dos lados, ele sopra no ouvido de Pilo que então dá um fim à briga.
Assim, eles levam uma bolada de grana às custas
da luta que encenaram, e têm dinheiro para comer. Durante a cena, não passa
despercebida à Pilo a beleza de uma jovem que os observava ali por perto.
Tal jovem é Glorinha (Monique Lafond, de filmes
como “Eu” e o clássico erótico “Gisele”) e, mais tarde, ela própria vem a
procurar pelo auxílio do quarteto: Seu pai arqueólogo (Carlos Kurt, figurinha
fácil nos filmes dos Trapalhões) desapareceu durante uma expedição atrás das
tais Minas do Rei Salomão, e agora ela busca por ele. Ao grupo junta-se o galã
da vez –pois quase todo filme dos Trapalhões tem um –Alberto (Francisco Di
Franco) que forma, com Pilo e Glorinha, um pra lá de desajeitado triângulo
amoroso; porque as rusgas entre os dois oscilam entre o banal e o imaturo;
porque apesar de bela, Monique Lafond interpreta no piloto automático, e
porque, diferente de “Os Saltimbancos Trapalhões”, o diretor Tanko não dá a
esse aspecto qualquer importância.
Aliás, importância, no sentido de
aprofundamento, a direção não dá à coisa alguma: Até mesmo o mote que serve de
gatilho à trama principal do filme, por razões óbvias, acaba sendo deveras
vago; afinal, se o pai de Glorinha desapareceu no rastro das Minas do Rei
Salomão (aquelas mostradas do livro de H. Rider Haggard, e num sem-fim de
adaptações cinematográficas), então, seria de se presumir que isso tivesse se
dado na África do Sul.
No filme, nada fica muito claro, mas a julgar
pela pouca noção geográfica que o filme nos dá, os protagonistas saem de
Itapemirim (!) para alguma floresta na região, se perdem e se separam quando
são emboscados por um bando de ciganos (!), todos interessados em surrupiar o
medalhão que Glorinha traz consigo –única pista do paradeiro do pai –e depois
acabam indo parar num deserto, onde cruzam com um certo Paxá (o hoje pouco
lembrado comediante Carvalhinho) e sua criadagem, além de uma bruxa malvada
(Vera Setta) e seu aliado, um velho feiticeiro, ou algo assim... (Wilson Grey).
Ambos são figuras que vem corroborar os elementos cada vez mais infantilizados
desta produção à medida que ela se vê destituída de recursos para concretizar
algumas das pretensões inicialmente sugeridas no roteiro.
Após uma sucessão de bagunçados encontros e
desencontros, de embates contra os ciganos, e de trapalhadas jogadas
aleatoriamente na narrativa, a trupe chega a uma tribo onde finalmente
encontram o pai de Glorinha capturado. E outras bagunças e trapalhadas
aleatórias novamente se sucedem –há certo apreço do diretor Tanko em capturar
esse tumulto tão autêntico em filme, ainda que pouco resulte de realmente
interessante nisso.
O clímax de “O Trapalhão nas Minas do Rei
Salomão”, mostra Pilo e Alberto salvando seus companheiros dos índios tocando
um trator com escavadeira sobre suas casas, numa sequência que certamente não
seria feita hoje em função do politicamente correto.
Não que hajam manifestações de ousadia neste
filme, ele é só sem noção mesmo...
No desfecho, como se tornou comum em várias
produções dos Trapalhões, a mocinha que o personagem de Renato Aragão passou
todo o filme a cobiçar acaba trocando-o pelo galã, todavia, uma intervenção de
boa sorte vem logo em seguida: Ele cai com seu cachorro num buraco do chão
(isso depois do velho arqueólogo lhes garantir que não existia qualquer mina
por perto) e eis que ele se descobre em meio aos tesouros do Rei Salomão!
No cômputo geral dos filmes
dos Trapalhões, “O Trapalhão nas Minas do Rei Salomão” ensaia algumas de suas
excelências (a direção de J.B. Tanko que só fez melhorar nos filmes seguintes;
e diversos lances de humor realmente inspirados) e já apresenta alguns de seus
lapsos (a gradual infantilização que banaliza o roteiro e o compromete a partir
da segunda metade), mas, de modo geral, é um entretenimento até hoje agradável.
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