segunda-feira, 28 de setembro de 2020

Amor Bandido

Terceiro filme do diretor Jeff Nichols, “Mud” é antecedido por “Separados Pelo Sangue” e “O Abrigo”. Todos são dotados de um forte senso comunitário e de uma predisposição em avaliar as características idiossincráticas e comportamentais de uma região, com ênfase nos Sul dos EUA.
Muito interessa a Nichols as criaturas tão sonhadoras quanto defeituosas geradas em determinado contexto da América –e todos os seus trabalhos até aqui dedicam seu tempo em focar nas consequências de suas escolhas e de seus objetivos.
Aqui, a câmera de Nichols acompanha Ellis (Tye Sheridan) e Neckbone (Jacob Lofland), dois garotos que passam seu tempo percorrendo as regiões desoladas dos rios que singram o Mississipi, onde moram.
Numa dessas idas e vindas, eles encontram um barco abandonado, e dentro dele, refugiando-se, acham Mud (Matthew McConaughey), um rapaz crescido também naquela região que lhes pede ajuda. Ao longo dos dias que se seguem, eles lhe levam comida e outros itens, enquanto Mud lhes conta histórias, não necessariamente verdadeiras, sobre como foi parar lá, e como de lá planeja sair junto com a mulher que é o amor de sua vida, Junniper (Reese Witherspoon, que curiosamente nunca chega a se encontrar em cena com McConaughey).
Existem homens misteriosos por perto, a tentar rastrear Mud com propósitos vingativos, assim como a polícia.
Trazido pelo rio, como qualquer outro artefato que lhe desperta maior ou menor fascínio, Mud é, aos olhos de Ellis, uma senha para o conhecimento de um mundo adulto onde se encontram elementos intrigantes –como as relações assim consumadas com o sexo oposto –e outros nem tão satisfatórios assim –o relacionamento já em frangalhos de seu pai (Ray McKinnon, de “Um Sonho Possível” e “Ford Vs Ferrari”) e sua mãe (Sarah Paulson, de “Virada No Jogo”) e o próprio histórico criminoso de Mud.
Bom diretor, Jeff Nichols mantém um excelente nível com este trabalho notável, onde as particularidades inerentes ao drama e ao suspense caminham juntas na consolidação gradual de algumas metáforas bem pontuadas em sua narrativa –o barco que Mud vai recuperando pouco a pouco com a ajuda dos meninos ou o iminente desmantelamento da casa onde a família de Ellis mora, num alegórico rito de crescimento que atravessa o filme, impregnado pela sensação de que a qualquer momento algo terrível pode acontecer.
Essa excelência garante que o emprego dos simbolismos não sobrecarregue o filme tornando “Mud” ao mesmo tempo um suspense sobre os caminhos tortuosos da vida (ganhando ares de ação policial e até mesmo faroeste em seu clímax), um drama do ponto de vista de um garoto onde os relacionamentos adultos em foco jamais encontram um ponto de equilíbrio e uma história de aprendizado e amadurecimento sobre a aceitação das desventuras inevitáveis.
É também mais um exemplo da surpreendente evolução ocorrida na carreira de Mathew McConaughey que, como o personagem-título Mud, entrega uma atuação no mínimo formidável.

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