quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Crimes do Coração


 Baseada na peça teatral “Crimes Of The Heart”, da dramaturga Beth Henley, a trama que conduz o filme realizado pelo australiano Bruce Beresford tem como elemento particular as idiossincrasias flagradas em seus personagens por meio do texto cheio de peculiaridade e estranheza.

Esse retrato rico em excentricidade de uma família do Sul dos EUA se incumbe basicamente de girar em torno das três irmãs Magrath, reunidas debaixo do mesmo teto após algum tempo separadas –tempo este que só ressaltou suas insondáveis diferenças: Lenny (Diane Keaton), a mais velha e mais acomodada se ressente pelo excesso de responsabilidade para com seu avô doente (Hurd Hatfield, de “Profissão: Ladrão”), o que a manteve presa e estagnada numa cidadezinha que não lhe reservava nem marido, nem futuro e nem felicidade; Babe (Sissy Spacek), a mais jovem, vive equilibrando-se na própria instabilidade o que a leva a contratempos calorosos como a tentativa de assassinato do próprio marido (pelo qual ela se vê na iminência de um lamentável julgamento) e um caso de adultério com um rapaz negro (e sendo ali o segregado sul dos EUA, a repercussão de tal caso resvala em perigo real); por fim, Meggy (Jessica Lange), a irmã do meio, a tempos ausente de casa na busca ainda infrutífera de seu sonho em virar estrela –fracasso este que não a impede de distribuir histórias inventadas por toda a vizinhança, inclusive para o apaixonado Doc (Sam Sheppard, marido de Jessica na vida real), também ele um homem casado.

Os temperamentos bastante distintos das três irmãs –e, não rato, conflituosos uns com os outros –encontram quase um único ponto da equilíbrio: O pesar impronunciável que o suicídio da mãe provocou em cada uma delas.

Ambientado quase todo no cenário do belo casarão da família delas –embora o filme escape, para efeitos de transposição cinematográfica, para um ou outro ambiente diferente em algumas cenas adaptadas –o trabalho de Beresford, como praticamente todos os filmes entregues por ele, segue seu estilo austero, privilegiando a beleza poética de pequenos detalhes banais do dia-a-dia (o assoprar de velas de um bolo de ainversário; a colheita de algumas frutas maduras; a contemplação do entardecer), o que provoca uma curiosa contração no humor peculiar e no excentrismo comportamental do texto original, fazendo tais características diluírem até quase desaparecerem.

Se o filme prende o expectador até o fim –tarefa que não é cumprida com toda a unanimidade do público –é pelo empenho e pela capacidade esplêndida do trio sensacional de atrizes reunidas: Alternando humores, richas, nervos acirrados, alegrias e tristezas, Keaton, Lange e Spacek estão formidáveis cada qual em seu papel, valorizando uma obra construída essencialmente para a dinâmica do palco, onde o elenco é, por definição, sua majestade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário