A cena que abre esta segunda parte do épico gangster filmado por Takashi Miike com recursos técnicos peculiares se dá no trecho final do primeiro filme, quando os personagens Takashi (Kazuya Kimura) e Hideshi (Kouichi Iwaki) invadem a cúpula do asqueroso gangster Kenmoshi (Kenichi Endo, de “Operação Invasão 2”) só para flagrar a esposa de Takashi sendo estuprada –logo, tanto “Cena Mafiosa 1” quanto este “2” têm seus inícios pontuados e marcados por uma cena de estupro, bem ao gosto extremo e desconcertante de Miike.
Adaptado de uma história em quadrinhos japonesa
(o chamado mangá) de autoria de Hisao Maki, “Cena Mafiosa” não deve ser
considerado, e nem com essa intenção foi realizado, como um retrato de
quaisquer inclinações realistas da yakuza, a máfia japonesa. Nem poderia,
diante da profusão de tiroteios desregrados, conluios sem pé nem cabeça,
guinadas abruptas e revelações com um pé no absurdo que ocupam esta segunda
parte de maneira ainda mais atordoante que sua já bastante inconsequente primeira
parte.
Retomamos a procura dos dois irmãos Takashi e
Hideshi por seu outro irmão, o ex-pistoleiro Takeshi Relâmpago (Taishü Kase),
depois que este virou alvo da yakuza ao promover um massacre entre chefões.
Mas, Takeshi, eles descobrem, enamorou-se. Está junto da amada Rie Ishibashi
(Naoko Inoue), junto da qual refugiou-se nas dependências beneficentes de uma
Igreja aberta para fins benevolentes. Takeshi deixou o ofício de matador, um
tanto quanto incentivado pela revelação de que um dos mafiosos que ele matara
numa das cenas mais caóticas e marcantes do filme anterior era, na verdade, seu
pai (!).
Além dessa intriga entre os três irmãos, que
eventualmente unem-se em seus apuros, a trama traz vários outros personagens
–além do chefe vingativo Kenmoshi, há também a madrasta de Rie, a gueixa
veterana Chiharu; a mãe senil dos três protagonistas Haruko; e a bela mafiosa
Hisako (Yôko Natsuki) que apresenta-se como uma aliada potencial e crucial para
o sisudo Hideshi em seu caminho de vingança –numa ramificação bastante
característica de um gênero pontuado por alianças e traições sistemáticas,
contudo, tais personagens parecem tratados com relativo desprezo pela narrativa
de Takashi Miike (de forma ainda mais displicente neste segundo filme que no
primeiro), a ele parece mais interessar as percepções mais fisiológicas da
traição e da violência (e closes minimalistas das expressões normalmente
aflitas de seu elenco) e as consequências mais físicas do que necessariamente
existenciais de suas escolhas.
Nesse sentido –embora este filme careça da
qualidade mais sólida e inquestionável que ele mostrou em outras realizações –é
aqui, mais do que em qualquer outro trabalho que se pode concordar com a pecha
de “Quentin Tarantino japonês” com a qual Takashi Miike sempre passou a ser
relacionado –ainda que eu prefira acreditar que seja Quentin Tarantino o
“Takashi Miike norte-americano”! As características que eles compartilham são
inúmeras: Uma predisposição irreprimível e pessoal para a violência e o crime
urbano, temperada a uma convulsiva variedade de códigos de gêneros a definir a
inúmeras cenas de embate que se seguem.
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