quinta-feira, 7 de janeiro de 2021

Febre de Juventude


 Em meados da década de 1960, o mundo e a cultura pop foram tomados de assaltado por um fenômeno conhecido como os Beatles! Parte daquela geração –e, portanto, conhecedores profundos da euforia e do entusiasmo que caracterizava aqueles jovens –o roteirista Bob Gale, o diretor Robert Zemeckis e o produtor Steven Spielberg tiveram, no final dos anos 1970, a ideia de empregar tal ideia num filme de época que retratava a juventude da década anterior justamente numa vibração que a fazia tão singular; e aos olhos dos expectadores, tão paradoxalmente universal.

“Febre de Juventude” assim sendo relata a histórica apresentação dos Beatles no Ed Sullivan Show, em Nova York, na noite de 9 de fevereiro de 1964, marcando a primeira apresentação do grupo em território norte-americano, tudo isso pelos olhos de seus personagens protagonistas, um grupo de jovens amigos moradores de Nova Jersey.

As garotas Grace (Theresa Saldana) e Rosie (Wendy Jo Seperber) não poderiam ser mais aficcionadas por Beatles –o que faz delas verdadeiras enciclopédias histéricas e ambulantes sobre a banda. Amiga delas, Pam (Nancy Allen, atriz dos primeiros filmes de Brian De Palma) quer valorizar mais o noivado que os ídolos –sem, porém, muita convicção. As três têm uma ideia de como adentrar o Hotel Plaza e chegar até o famoso quarteto: A bordo de uma limusine, único tipo de veículo que não é revistado por policiais. Entra em cena, portanto, o jovem Larry (Marc McClure, o Jimmy Olsen de “Superman-O Filme”), interessado em Grace e que, por conta disso, providencia uma das limusines de aluguel de seu pai para fazer as vontades da garota. Todos eles, mais Janis (Susan Kendall Newman) e o revoltado Tony (Bobby Di Cicco), dois jovens dissonantes que não gostam dos Beatles, seguem rumo à Nova York.

Outros personagens, mais a frente, se somam à eles: O algo esquisitão Richard (Eddie Deezen, de “1941-Uma Guerra Muito Louca”), funcionário do hotel que aquartelou-se clandestinamente num dos apartamentos vagos para poder organizar um meio de encontrar seus ídolos, e o garotinho Peter (Christian Juttner), cujo corte de cabelo aos moldes do grupo –comprido para os padrões conservadores de então –é fonte de desgosto para seu pai (Read Morgan) que, por isso, confiscou suas entradas para o cobiçado show.

Com muito bom humor, a narrativa de Zemeckis explora a histeria divertida das fãs que se aglomeram em frente ao Hotel Plaza e promovem as maiores maluquices justificadas por sua devoção: Como comprar pedaços de lençóis supostamente usados por John, Paul, Ringo e George; gritar a plenos pulmões por qualquer indícios das estrelas (até mesmo por um espanador na janela, confundido com um dos cabeludos!) e tentar penetrar o cerco cerrado da polícia feito ao redor do hotel.

É claro que as protagonistas fazem exatamente isso; e o filme acompanha as idas e vindas farsescas delas, às voltas com as facetas ridículas e absurdas de sua adoração –e Zemeckis, diga-se, vale-se dessa premissa orbital em torno das figuras icônicas da música para brincar com sua presença (ou ausência) o tempo todo; John, Paul, Ringo e George (que, sensatamente não são interpretados por sósias escalados) aparecem em cenas documentais espertamente conectadas à narrativa, ou em elipses que indicam que eles estão ali –personificados, quando muito, por dublês –mas, nunca deixam de conceber ao quarteto de Liverpool uma aura mística. Uma sinergia que, em parte, reflete a graciosidade com a qual Zemeckis promove o desfile de figuras históricas americanas em “Forrest Gump”.

Com o tempo, “Febre de Juventude” em sua nostalgia pulsante e vívida, e sua diversão ingênua e saborosa tornou-se um daqueles clássicos da sessão da tarde, idolatrados por gerações de cinéfilos ocasionais que o assistiram na TV durante os anos 1980 e 90, entretanto, sua característica mais marcante talvez tenha sido a descoberta da sintonia empolgante e produtiva entre seus realizadores, Zemeckis na direção, Gale no roteiro e Spielberg na produção; o resultado disso foi que novos (e ainda melhores) projetos afloraram ao longo dos anos, culminando numa das mais vibrantes realizações da década de 1980, quiçá de todo o cinema: O brilhante “De Volta Para O Futuro”.

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