quarta-feira, 16 de junho de 2021

Inferno Vermelho


 Deve ter soado como um provocação colocar, num filme policial de ação, um tira norte-americano ao lado de um policial soviético, em plena década de 1980, durante o últimos extertores da Guerra Fria, mas, é exatamente a curiosidade em torno desse choque cultural –além das cenas truculentas de ação de praxe –a proposta por trás de “Inferno Vermelho”, de Walter Hill.

Produzido no esquema picareta da Cannon Films –produtora de cinema que lucrou muito com filmes pauleiras de ação e de orçamento relativamente baixo nos anos 1980 –o filme era uma ideia do diretor Hill, que pegava emprestado um mote similar ao da antiga série “O Agente da U.N.C.L.E.”; no caso, colocar um agente russo e outro americano como parceiros (espiões naquele caso; policiais aqui), moldando a premissa em torno dessa dupla tão improvável a partir de expedientes convencionais de gênero, dando-lhes um frescor inusitado mesmo assim.

A cena que abre “Inferno Vermelho” é indicativa do desembaraço de Walter Hill para com qualquer sutileza: Uma sauna russa (onde flagramos alguma nudez feminina também) onde o astro Arnold Schwarzenegger já chega mostrando sua musculatura impressionante de fisioculturista. Pouco se fala até que ele saia no braço com alguns dos mau-encarados presentes –só então ficamos sabendo que ele, Ivan Danko, é um policial russo determinado a capturar o traficante de cocaína Viktor Rosta (Ed O’Ross, de “Nascido Para Matar” e “Cotton Club”).

Contudo, Rosta foge para os EUA –não sem antes matar o parceiro de Danko adicionando a boa e velha motivação pessoal nos objetivos do protagonista –o que obriga Danko a viajar para terras norte-americanas (a cidade de Chicago, mais precisamente) e, nas palavras de seus superiores, impedir que o “veneno do Ocidente” venha para a URSS.

Uma vez em solo americano, a polícia de Chicago designa o encrenqueiro policial Art Ridzik (Jim Belushi, irmão mais novo do saudoso John Belushi) para servir de escolta para Danko em tempo integral –apenas para se livrarem dele!

Assim, em poucos minutos, está estabelecida a bem azeitada fórmula da dupla de policiais –um engraçado, alívio cômico; outro taciturno e mal-humorado –que tanto rendeu naqueles idos dos anos 1980. “Inferno Vermelho” não é exceção: Veterano habituado ao esquema e às narrativas que compunham o cinema de ação daquele período, Walter Hill sabe impor a tensão, o ritmo, a truculência e a urgência que uma premissa assim necessita, mantendo a plateia devidamente entretida com sua narrativa de investigação.

Ele é tão bem-sucedido em tornar apetecível essa trama simples e simplória –auxiliado também pela boa química entre Schwarzenegger e Belushi –que pouco se nota da absoluta falta de profundidade em questões mais políticas ou culturais a envolver seus dois protagonistas: Este é um filme dos anos 1980 com todas as letras, onde menos está em foco a reflexão ocasionada por sua circunstância e mais a plena diversão escapista de suas idas e vindas, o desligamento do cérebro para meramente se divertir.

Vale lembrar que, se o filme funciona, o mérito é quase todo de seu astro: Numa primeira impressão, incapaz de convencer numa interpretação de ser humano normal (!), o bruta-montes Arnold Schwarzenegger cai habilmente bem no papel de Ivan Danko pelo mero retrato quase caricato, espartano e até certo ponto preconceituoso que a produção faz do povo soviético. Todavia, ainda que seja uma vã tentativa aguardar por uma boa atuação da parte dele, Schwarzenegger é (e ao longo da carreira, sempre foi) muito esperto na escolha pontual de papéis que lhe são minimamente adequados. Como Ivan Danko, se ele não  ombreia um Lawrence Olivier, ao menos, tem grande presença e é plenamente carismático, mais do que capaz de levar o filme nas costas e de distrair o público do fato de que, no filme de ação que se propõe, a produção mais contida e investigativa não é lá tão explosiva quanto se poderia esperar.

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