sexta-feira, 18 de junho de 2021

Os Delírios de Consumo de Becky Bloom


 A histriônica atriz Isla Fisher conseguiu destacar-se no bem-sucedido “Penetras Bons de Bico” no incontrolável papel de uma quase ninfomaníaca. Tanto chamou a atenção que o diretor australiano P.J. Hogan (de “O Casamento de Muriel” e “O Casamento do Meu Melhor Amigo”) apostou nela para protagonizar esta adaptação do livro de Sophie Kinsella, uma ágil comédia que une “O Diabo Veste Prada” à “Rosalie Vai Às Compras”.

Num registro colorido e plural do consumismo capitalista que permeia todo o filme, conhecemos a compulsão de Rebecca Bloomwood (Isla Fisher, cujos exageros ocasionalmente comprometem sua adequação ao papel), moça nova-iorquina que vive em funções das compras –na narração dela própria, descobrimos que as próprias vitrines das lojas parecem ganhar vida e chamá-la a comprar os diversos adereços.

Por conta disso, Rebecca vive com suas finanças no vermelho. O que a leva a almejar um ofício prontamente rentável. A fim de unir suas aptidões às suas necessidades, a intenção primordial de Rebecca acaba sendo obter um cargo na prestigiada revista de moda “Alette”, já que afinal, consumista voraz. Rebecca sabe tudo sobre marcas e griffes.

Todavia, a aguardada entrevista de emprego –à qual ela comparece com uma ostensiva echarpe verde –dá errado: A sonhada vaga já foi preenchida. Resta, contudo, uma outra alternativa, comer pelas beiradas: No mesmo prédio da “Alette”, outros escritórios, de outras revistas, também funcionam, sendo assim, Rebecca ainda tem a chance de ser aceita em outro departamento e, com sorte, ir subindo de nível, até atingir seu Santo Graal na revista de moda. E a chance que aparece vem a ser uma ironia do destino: Uma vaga na revista “Economia de Sucesso” –justamente uma publicação que orienta os leitores a controlar suas finanças e não deixar-se levar por suas compulsões de consumismo.

Contra todas as possibilidades, Rebecca redige uma carta que surpreende o jovem editor-chefe, Luke Brandon (Hugh Dancy, de “Falcão Negro Em Perigo” e “Histeria”), convencendo-o de que, diferente da realidade, ela é alguém especializada em finanças e perfeitamente capaz de administrar o próprio dinheiro (e logo, ensinar leitores a fazê-lo também!).

Esta comédia, conduzida com bastante sagacidade por P.J. Hogan, é assim aquela modalidade de farsa onde a adorável protagonista equilibra uma sucessão de mentiras –a persona gastadeira que ela oculta de todos no trabalho, onde ganha fama (na misteriosa coluna “A Garota da Echarpe Verde”) aconselhando o oposto do que realmente faz; seus hábitos caloteiros (e que colocam um implacável cobrador em seu encalço) que a levam a frequentar uma reunião de Compradores Anônimos (!); e o fato de encobrir tudo isso do razoável e envolvente Brandon, por quem ela vai se apaixonando, a despeito de todas as mentiras que conta a ele –até que a narrativa as empilha e acumula de tal maneira que todas explodem em confusões a partir de um determinado ponto do filme. O que eu vejo como ponto oscilante dessa produção é justamente o fato de Hogan ancorar isso tudo em Isla Fisher: Embora simpática e relativamente esforçada (em alguns momentos até demais!), ela não dispõe da doçura genuína de uma Sandra Bullock, nem da serenidade para o cômico e para o terno que fez de Meg Ryan uma estrela; em vez disso, ela emprega os mesmos arroubos que moldou para sua personagem em “Penetras Bons de Bico” –personagem esta de orientação completamente diferente da Rebecca Bloomwood que vemos aqui.

Uma coisa é destacar-se como coadjuvante histérica e irrequieta, outra, bem diferente, é saber dosar os momentos de maior ou menor intensidade para, como protagonista, levar todo um filme nas costas. Menos mal que, no elenco de apoio, P.J. Hogan soube escolher com muito mais primazia: Há John Goodman e Joan Cusack, sensacionais como os pais desprendidos e deselegantes da heroína; Kristin Scott-Thomas, sempre maravilhosa no papel da endeusada Alette Naylor; pontas pertinentes e precisas de John Lithgow, Leslie Bibb e Krysten Ritter (esta como a melhor amiga de Rebecca); e, sobretudo, Hugh Dancy, na medida certa de suavidade e simpatia para contrapor os desvarios de sua aloprada parceira de cena.

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