segunda-feira, 23 de agosto de 2021

O Dia Em Que A Terra Parou


 Antes da impressão um tanto razoável de que o diretor Scott Derikson estava a adentrar território sagrado refilmando o clássico da ficção científica de 1951, é preciso lembrar que o filme original, dirigido então por Robert Wise, já é antigo o bastante para permitir uma repaginada bastante promissora, sobretudo no que tange aos seus aspectos técnicos; elemento sempre importante no gênero da ficção científica.

E Derikson ainda faz um esforçado dever de casa: Ele capricha no trabalho de condução e direção, ciente da oportunidade preciosa que ganhara (após o surpreendente sucesso de seu “O Exorcismo de Emily Rose”), e seu roteiro, para além da trama de simplicidade alegórica anti-belicista que definia o original, acrescenta elementos que se fazem pertinentes, especialmente na primeira parte, em que seu fôlego narrativo ainda se mostra ávido.

As coisas já começam interessantes no prólogo, a mostrar um alpinista (Keanu Reeves) tendo um contato imediato com um ser de outro mundo numa longínqua montanha gélida: Eis, portanto, a origem, por assim dizer, do corpo terreno do alienígena Klaatu.

Corta então para a atualidade, para a personagem da belíssima Jennifer Connelly, Dra. Benson, recrutada em seu próprio lar, na calada da noite e em circunstâncias nebulosas, para integrar um time de especialistas numa operação sem precedentes: Um objeto voador não identificado está vindo do espaço com rota fixada em Londres. E os indícios mais recentes, de desacelaração e manobra aérea, indicam que não é um meteoro ou um asteróide qualquer e sim uma nave tripulada.

É curioso como filmes envolvendo extraterrestres têm, na primeira parte de sua premissa, os momentos mais sugestivos e instigantes: Observe como a mesma coisa acaba acontecendo em “Independence Day”, do qual o filme de Derikson acaba, invariavelmente, pegando alguns elementos emprestados –a atmosfera iminentes de fim do mundo, o retrato algo clichê da relação cientistas/militares, a postura sempre relapsa das autoridades (representada aqui por uma pouco aproveitada Kathy Bates) e, certamente, a confiança desmesurada depositada nos efeitos visuais de ponta.

É logo em seguida, contudo, que o novo “O Dia Em Que A Terra Parou” mostra um de seus maiores trunfos: Quando, já na iminência do contato entre os humanos perplexos e os alienígenas visitantes, o ser do espaço se revela numa familiar aparência humana, interpretado assim por Keanu Reeves –sempre um bom ator que, pelo perfil camaleônico de toda sua filmografia e pela postura algo questionadora com que sempre guiou sua carreira, acaba caindo como uma luva no papel do alienígena Klaatu!

Pena que não demora muito –logo depois que Klaatu resolve fugir do confinamento onde as autoridades terrenas tentam colocá-lo, na companhia da Dra. Benson, o único humano sensato que achou pela frente –para o filme engatar uma marcha mais desanimadora, rumo a um sem-fim de cenas que estiveram em quase todas as obras do gênero a tratar de invasão alienígena nos últimos tempos: O poder incontrolável que ameaça toda a raça humana (na forma do robô Gort, sabiamente mantido em suas características memoráveis do filme anterior); a gradual descoberta do alienígena de que a humanidade merece, sim, ser poupada apesar de seus erros que comprometeram o ecossistema da Terra (o que responde pela demagógica participação de John Cleese); e até mesmo a relação um tanto forçada (certamente o aspecto mais enfadonho do filme) entre o alienígena e o garotinho, filho adotivo da Dra. Benson, vivido sem a menor inspiração por Jaden Smith, filho do próprio Will Smith.

Há menos inocência nesta refilmagem em comparação com o clássico antibélico de Robert Wise –o antigo “O Dia Em Que A Terra Parou” requer cumplicidade do expectador atual para ser devidamente compreendido e aproveitado –mas, a tensão política, a reflexão ecológica (uma conclusão bastante óbvia) e as imagens visualmente recauchutadas para uma nova geração não chegam a ser tão marcantes quanto o foram nos anos 1950; talvez nem seja culpa do filme mediano que Derikson entregou: Os expectadores de hoje em dia se habituaram a não se surpreender com nada e a se incomodar com tudo.

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