segunda-feira, 20 de maio de 2024

A Grande Entrevista


 O longa-metragem dirigido por Philip Martin, e lançado pela Netflix, entra na mesma categoria de obras aclamadas como “Todos Os Homens do Presidente”, “O Informante” e mais recentemente “Spotlight-Segredos Revelados”: Um cinema sério, feito por e para gente grande, empenhado em refletir posturas de correção no mundo moderno e apontar os lapsos de moralidade, ao mesmo tempo que faz um enaltecimento quase indireto ao estoicismo jornalístico.

“A Grande Entrevista” parte de uma polêmica entrevista prestada pelo Príncipe Andrew, filho da Rainha Elizabeth II, da Inglaterra, irmão do então Príncipe Charles, à entrevistadora Emily Maitlis no programa “Newsnight”, da BBC, em 2019. Nele, são abordados os tensos preparativos que antecederam a realização do programa e sua posterior repercussão, suas protagonistas são três mulheres que serviram de esteio à esta cruzada pela verdade: A produtora Sam McAlister (Billie Piper, da série “Doctor Who”), a própria Emily Maitlis (Gillian Anderson, a Ag. Scully da série “Arquivo X”) e a editora-chefe Esme Wren (Romola Garai, de “Desejo e Reparação”).

Entretanto, tudo teve realmente início em 2010, quando uma foto tirada com empenho incansável por um papparazzi relacionou o Príncipe Andrew, o Duque de York (Rufus Sewell), ao milionário Jeffrey Epstein, então acusado de abuso sexual. Nove anos depois, o serviço de Relações Públicas da Família Real –representado, em sua maior totalidade, pela engajada e solícita Amanda Thirsk (Keeley Hawes, da série “Orphan Black”) –ainda sofre para desvencilhar a imagem de Andrew daquele flagrante com Epstein.

Embora visto como um episódio de importância requentada ante a opinião pública, e por isso, nada atrativo aos olhos dos profissionais do “Newsnight”, sempre farejando a notícia bombástica do dia seguinte, esse assunto desperta a atenção de Sam McAlister que logo estabelece uma proximidade com Amanda Thirsk, deixando em aberto a chance para uma declaração pública via “Newsnight”. Logo, essa declaração se torna mais do que esperada, se torna crucial –Epstein, num de seus retornos aos EUA é preso pelo FBI sob acusação de tráfico sexual e, meses depois, enquanto aguardava julgamento, comete suicídio em sua cela. Esses desenlaces dramáticos, somados à descobertas comprometedoras como fotos e denúncias de uma das jovens aliciadas contra o Príncipe Andrew estimulam a necessidade de uma declaração e então a sempre inacessível Família Real permite abrir as portas do Palácio de Buckingham para uma equipe da “Newsnight”.

A entrevista, planejada, ensaiada e cronometrada à exaustão por ambas as equipes (da “Newsnight”, com Emily, Sam, Esme e todo o seu staff dedicado a elaborar as mais honestas e incisivas perguntas possíveis, e dos assessores de mídia da Família Real, preocupados com a situação delicada em que tal entrevista pode colocar todos eles) é aguardada com tensa expectativa; da parte de Emily, cuja lembrança do caso Monica Lewinsky a faz posicionar-se para que um novo assediador não torne a escapar impunemente; e da parte de Andrew, disposto a limpar seu nome perante os súditos britânicos e, sobretudo, perante o olhar da própria Rainha Mãe.

Diretor de inúmeros episódios da elogiada série “The Crow”, Philip Martin não parece esconder nem um pouco seu inesgotável interesse pelos contratempos envolvendo membros da Família Real. Aqui num recorte de tempo bem mais atual e recente em relação à reconstituição história de sua série televisiva, ele reconstitui –com alguma liberdade poética, mas não sem um aguçado viés narrativo –um dos maiores escândalos modernos a envolver a monarquia britânica.

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