É notável perceber a evolução de Ron Howard como
diretor ao longo de sua carreira.
No início, em seus primeiros filmes nos anos
1970 e 1980, ele não parecia ser levado muito à sério, certamente por ser o
típico ator que arriscava sentar na cadeira de diretor. Isso se reflete em
filmes bastante comerciais, despretensiosos e leves como "Splash-Uma
Sereia Em Minha Vida", "Fábrica de Loucuras" ou o épico
romântico "Um Sonho Distante".
Contudo, desde dessa época é perceptível um
tino muito afiado dos elementos que, no final das contas, fazem um bom filme.
Howard sempre teve um indelével instinto para
filmar.
Nos anos 1990, seus trabalhos já exigiam um
pouco mais de respeito por parte de público e crítica, sobretudo "Apollo
13" cuja esmerada reconstituição aliada à um aparato técnico espetacular
rendeu um produto que concorreu à oito prêmios no Oscar de 1995 (o de Melhor
Filme, só para constar, ele perdeu para "Coração Valente"). A partir
daí, era como se Ron Howard tivesse sido enfim abalizado como cineasta: Ele
fez, entre outros projetos, o bom "Ransom-O Preço de Um Resgate",
ganhou o Oscar em 2001 por "Uma Mente Brilhante", encarregou-se do
blockbuster "O Código Da Vinci", voltou ao Oscar em 2008 com o
thriller político "Frost/Nixon".
É bem provável que seu melhor trabalho seja o
mais recente "Rush-No Limite da Emoção", que reconstitui a obcecada e
inacreditável rivalidade entre James Hunt e Nikki Lauda no GP de 1976.
No novo "No Coração do Mar", Howard
reúne-se mais uma vez com o ator daquele filme (o sempre esforçado Chris
Hemsworth) para relatar, em tons poderosamente épicos, o acontecimento real que
levou à criação do livro "Moby Dick".
Tudo começa com o escritor Hellmann Melville em
pessoa (interpretado por Ben Whishan, o Q dos filmes de 007 com Daniel Craig) à
procura de um certo senhor que, ele crê, irá lhe relatar a história que poderá
render material para o seu mais extraordinário trabalho: Um livro sobre a
obsessão de um capitão de navio baleeiro em busca de uma descomunal baleia
branca.
De início arredio, o velho (a última testemunha
dos eventos, interpretado pelo grande Brendan Gleeson na idade adulta e pelo
ótimo Tom Holland, quando jovem) revela a ele passo a passo a história que
envolve as personalidades conflitantes de dois homens, o capitão Pollard e seu
primeiro-imediato Chase (Hemsworth, uma boa presença), e como essa dinâmica
entre os dois terminou conduzindo tripulação e embarcação pelos confins dos
mares do Oceano Pacífico,onde cruzaram com uma baleia branca monstruosa, e
enfrentaram percalços que marcaram a vida de todos os que sobreviveram.
Não é o melhor trabalho de Ron Howard nem por
um decreto; não possui o equilíbrio de "Uma Mente Brilhante", nem a
objetividade pulsante de "Rush", na verdade, sua narrativa muitas
vezes peca pelo peso da tensão imposta em muitos momentos, tornando-o desgastante
e longo.
Mas é nitidamente uma obra que pede por um
diretor no absoluto controle de seu ofício, e isso, Howard o faz com evidente
primor: A fotografia, com imodesto emprego do recurso 3D, funciona que é uma
beleza, o elenco de um modo geral tem uma competência uníssona, e a julgar pela
dificuldade que sempre se alardeia ser o fato de filmar em alto-mar, o
resultado detalhado e rico que se vê na tela, seja em ritmo e continuidade,
merece ser chamado de obra de arte.
"No Coração do
Mar" pode não agradar tanto aqueles expectadores que se ressentem de um
trabalho menos denso e dramático (como a grande maioria dos lançamentos que se
espera para as férias de fim de ano), mas não deixa de ser um espetáculo de
realização.
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