terça-feira, 22 de novembro de 2016

Entrevista Com O Vampiro

“Morte piedosa. Como ama sua preciosa culpa!”
Das tantas adaptações literárias que enfrentaram o crivo ferrenho dos fãs para encontrar um caminho adequado que as levasse para a tela grande, uma das que mais sofreu repercussões certamente foi a versão cinematográfica da primeira parte das “Crônicas do Vampiro”, de Anne Rice que na época (primeira metade da década de 1990) era uma das obras literárias mais populares e aclamadas de então.
Não importava se a direção ficaria a cargo do talentoso e conceituado Neil Jordan (diretor irlandês cuja presença já antevia uma aura desigual ao projeto), não importava se o personagem Lestat seria interpretado pelo normalmente dedicado Tom Cruise (um astro que, apesar de tudo, sempre demonstrou afinco nos filmes que recebiam sua atenção). Para os fãs e para a autora em pessoa, o projeto de “Entrevista Com O Vampiro” já nascia com uma névoa de frustração a cercá-lo, pelo simples fato de seu veredicto antecipado: O de ser o filme inferior ao livro.
Razões para o pessimismo nunca faltaram: O cinema dificilmente conseguiu igualar, em intensidade e detalhismo, as transposições de grandes e elogiados textos para a telona. Por que com uma das mais agraciadas revisões literárias do mito do vampiro isso seria diferente?
Mas, por incrível que possa parecer, o filme prova, paulatinamente, cena a cena, que isso não é uma verdade absoluta.
Do início ao fim, “Entrevista Com O Vampiro” pulsa de um preciosismo e de um esplendor visual que emolduram com indiscutível beleza a trama intrigante, apaixonada e reflexiva sobre as criaturas que atravessam a eternidade a lidar com os percalços de sua própria natureza imortal.
Tudo começa num quarto de hotel em São Francisco, no tempo presente –ou seja, 1994 –quando Louis (um adequado Brad Pitt) recebe um jovem repórter (Christian Slater, substituindo o ator River Phoenix, que veio a falecer) para a ele fazer uma revelação um tanto quanto estarrecedora: Ele é um vampiro cuja existência já se estende há longínquos 200 anos de idade!
Além disso, Louis também lhe conta toda a sua longa história, desde quando fora transformado pelo sanguinário Lestat (Tom Cruise, realmente sensacional no papel), passando pela dolorosa aceitação de sua condição de imortal criatura da noite, ao encontro com uma menina-vampira (Kirsten Dunst, estreando bem novinha no cinema, com uma personagem de sutilezas e complexidades bastante estremas para uma criança), culminando na sua estóica busca por outros de sua espécie e por respostas a suas tantas perguntas, terminando enfim no decorrer de dois séculos e no modo como aprendeu a assimilar uma nova época.
Um trabalho de inúmeras ramificações filosóficas, adaptado de maneira bela e esplendorosa, renovando o mito dos vampiros em seu registro cinematográfico da mesma forma que o best-seller de Anne Rice o fez décadas antes na literatura: Hoje, pode até constar, com justiça, em uma lista dos melhores filmes de vampiros do cinema.
A grande ironia é que a gritaria dos fãs e da autora soa ainda mais desmedida, injusta e desnecessária quando ficamos sabendo que uma continuação ‘bastarda’ deste filme foi realizada anos depois, sem Tom Cruise, sem Neil Jordan, e sem talento: Foi “A Rainha dos Condenados”, que trazia o apático Stuart Townsend no papel de Lestat, sequer estabelecendo maiores conexões com a trama pulsante deste filme.

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