sexta-feira, 14 de abril de 2017

Animais Noturnos

Elegância é a palavra chave no cinema de Tom Ford. A elegância que já impregnava cada detalhe em cena de sua auspiciosa estréia, “Direito de Amar”, continua a ditar o visual acachapante e lindo deste seu novo e notável trabalho.
Todavia, como atestam as desconcertantes cenas iniciais, existe espaço também, nesse esmero visual, para a feiúra: Em enquadramentos milimetricamente bem escolhidos e bem iluminados, mulheres velhas, gordas e nuas dançam em câmera lenta diante de uma câmera que parece fetichizá-las.
O grotesco, como veremos mais a frente, será um tópico que o filme de Ford perseguirá durante toda sua duração –e seu contraponto com a beleza gráfica, e com o curioso dado de que ela não trás plena felicidade, é um dos estranhos questionamentos que ele levanta.
Amy Adams, em toda sua beleza e excelência, é Suzan, curadora de um museu de arte moderna em Los Angeles. Ela se ressente pelo fato de sua vida e seu casamento de aparências não lhe proporcionarem satisfação: Isso não a deixa dormir.
Ela já havia sido casada antes, com Edward (Jake Gyllenhaal, que interpreta também o protagonista na história dentro da história), um escritor que ela deixou há dezenove anos.
Uma noite, Suzan recebe uma encomenda: Um manuscrito de um livro que Edward escreveu em sua homenagem.
Ela começa a leitura (cada vez mais obsessiva) do tal livro cuja trama guarda, de forma alegórica, uma inesperada ressonância com o matrimônio que tiveram. Não fosse a direção refinada de Ford, essa trama serviria também, à uma típica produção exploitation dos anos 1970: Família composta pelo marido (Gyllenhaal), pela esposa (Isla Fisher) e pela filha adolescente atravessa os desertos do centro-oeste americano à noite.
Tentam ultrapassar um carro ocupado por desordeiros liderados pelo ameaçador Ray (Aaron Taylor-Johnson), mas acabam arrumando encrenca com o grupo. Eles fazem seu carro parar e, após uma discussão extremamente tensa, carregam a mulher e a filha para outro lugar, deixando o marido à pé na estrada.
Com a ajuda de um policial (Michael Shannon) ele as procura dando início a uma escalada de momentos trágicos.
A condução vai assim contrabalançando essa trama árdua, violenta e desesperadora, com o dia a dia de Suzan e suas memórias ocasionais e elípticas da relação que teve com Edward, deixando que quaisquer analogias que sejam estabelecidas entre essas três linhas narrativas fiquem por conta do expectador.
Uma obra que justapõe as percepções da violência reprimida e/ou extravasada, os diferentes âmbitos de mundo em que elas se deflagram, e as conseqüências disso tudo no íntimo dos personagens, narrada com enorme perícia.

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