terça-feira, 18 de julho de 2017

Carrie - A Estranha

As adaptações para cinema de obras de Stephen King ainda não haviam virado moda quando Brian De Palma, nos anos 1970, decidiu transformar o livro “Carrie” em filme.
De Palma enxergou, na trama protagonizada por Carrie White (a magrela Sissy Spacek, vibrante e perfeita no papel), um invólucro perfeito para expressar suas características narrativas –que começavam a se consolidar junto ao público e crítica –num gênero ligeiramente distinto dos filmes de suspense em homenagem à Hitchcock que vinha fazendo: O terror explícito.
De Palma compreendeu que a caracterização da realidade (ou a falta dela, conforme o filme) consistia de um efeito diferente no público conforme o gênero por meio do qual uma determinada trama era abordada. Afoito a caracterizações expressivas e extravagantes, ele sabia que o melhor meio de conceber uma obra assustadora sobre os percalços desestabilizadores da juventude (e capaz de alcançar as impressões exigentes dessa mesma juventude) seria através de uma parábola de terror; e dentre os escritores, King era dos poucos que manipulava com habilidade textos que mesclavam medo sobrenatural e minúcia sentimental.
Não há, portanto (e nem precisa haver) sutileza, na forma como De Palma mostra que a desajeitada e tímida Carrie é perseguida no colégio onde é desprezada por meninos e meninas. Sua primeira cena já é de um exemplo audaz: A câmera passeia de modo quase lírico pelo banheiro feminino (e De Palma não se furta a flagrar algumas adolescentes nuas!) para terminar em Carrie que, durante o banho, tem sua primeira menstruação. Sem qualquer informação a respeito, a reação da jovem ao sangue é de pânico. E a de suas amigas, de crueldade: Elas menosprezam e riem do pavor dela.
São as fases comuns da adolescência, portanto, transfiguradas pelo talento de Brian De Palma e Stephen King, num instante do mais puro medo: Aquilo que de absolutamente pior poderia ocorrer numa situação.
Em sua casa, a rotina de Carrie se releva ainda pior: Sua mãe fanática (Piper Laurie) deixa a menina a beira de um constante ataque de nervos com suas recriminações de cunho excessivamente religioso. Além disso, os colegas de escola de Carrie (entre eles, um John Travolta em início de carreira) planejam novas maldades, entre as quais a mais ambiciosa é uma pegadinha terrível realizada no vindouro baile de formatura.
O quê ninguém sabe é que Carrie, aos poucos, desenvolve poderes paranormais cada vez mais perigosos que, somados à indignação das injustiças que acaba sofrendo, culminam em um verdadeiro banho de sangue justamente na noite de formatura.
Não obstante o sucesso que alcançou, bem como a forma inestimável com que marcou a cultura pop (a ponto de ganhar uma continuação prosaica e falha em 1999, uma infinidade de imitações e até uma ridícula e desnecessária refilmagem em 2013), o trabalho de adaptação de Brian De Palma à época foi tão desigual, estilizado e requintado que os livros de King, ainda assim, levariam quase uma década para serem absorvidos pela máquina hollywoodiana.

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